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lugubre aposento, como o estridulo ulular do mocho entre os sepulchros.
— Não é tanto como se te afigura na imaginação abalada pelos soffrimentos. O tempo pode muito, e com paciencia e resignação has-de te acostumar a esse novo viver, sem duvida muito mais suave do que este inferno de martyrios, e poderemos ainda gozar dias senão felizes, ao menos mais tranquillos e serenos.
— Para mim a tranquillidade não pode existir senão na sepultura, meo pae. Entre os dous supplicios que me deixão a escolher, eu vejo ainda alguma cousa, que me sorri como uma idéa consoladora, um recurso extremo, que Deos reserva para os desgraçados, cujos males são sem remedio.
— E’ da resignação sem duvida, que queres fallar, não é, minha filha?...
— Ah! meo pae, quando a resignação não é possivel, só a morte...
— Cala-te, filha!... não digas blasphemias e palavras loucas. Eu quero, eu preciso, que tu vivas. Terás animo de deixar teo pae neste mundo sósinho, velho e entregue á miseria e ao desamparo? Se me faltares, o que será de mim nas tristes conjuncturas em que me deixas?...
— Perdoe-me, meo bom, meo querido pae; só em um caso extremo eu me lembraria de morrer. Eu sei que devo viver para meo pae, e é isso