Página:A illustre Casa de Ramires (1900).djvu/409

Wikisource, a biblioteca livre
A ILUSTRE CASA DE RAMIRES
401

o charuto com beatitude. Todos os tedios e incertezas d’essas semanas se despegavam da sua alma como cinza apagada, brevemente varrida. E foi sentindo menos a doçura da noite, que um sabor melhor á vida desanuviada, que exclamou:

— Pois, senhores, agora, está uma delicia!...

Videirinha, depois d’um curto cigarro, retomára o violão. Atravez da quinta, pedaços de muros caiados, algum trilho de rua mais descoberto, a agua do Tanque-Grande, rebrilhavam ao luar que resvalava dos cerros; e a quietação do arvoredo, da claridade, da noite, penetravam n’alma com adormecedora caricia. Titó e Gonçalo saboreavam o famoso cognac de Moscatel, preciosa antigualha da Torre, silenciosamente enlevados no Videirinha — que recuára para o fundo da varanda, se envolvera em sombra. Nunca o bom cantador ferira as cordas com inspiração mais enternecida. Até os campos, o ceu inclinado, a lua cheia sobre as collinas, escutavam os queixumes do fadoda Ariosa. E no escuro, sob a varanda, o pigarro da Rosa, os passos abafados dos creados, algum sumido riso de rapariga, o bater das orelhas d’um perdigueiro — eram como a presença d’um povo suavemente attrahido pelo descante formoso.

Assim a noite se alongou, a lua subio com solitario