as ladroeiras bem amuradas, onde se acoita o suborno, a dilapidação e o peculato, onde a política e a administração, à puridade, se entregam a todas as ignomínias do mau viver. Aqui, os salões, as galerias, os anfiteatros da comédia dramatizada, onde os mesmos atores daquelas cenas declamam e representam as da honestidade.
Os mesmos homens hão de fazer, sucessiva ou simultaneamente, esses papéis inconciliáveis. Os representantes do povo, que se venderam ao poder, os negocistas, que sem profissão alguma enriqueceram dos seus votos nas comissões, dos seus discursos na tribuna, das suas corretagens nas secretarias, ou dos seus atos no governo, os arrivistes e parvenus, os nouveau-riches ou profiteurs do tráfego republicano, esses a quem Pinheiro Machado chamava “os gaviões de penacho”, querem ver-se acatados, querem que se lhes guarde reverência, querem que não lhes zunam pelas orelhas as pedradas, quando assomam ao proscênio, engravatados na solenidade convencional, entoando epitalâmios e cânticos virginais à democracia sem mancha, em cujas entranhas se geram prodígios tais de civismo e austeridade.
Eis a encenação, o palco, a rampa alagada em luz, as gambiarras acesas a giorno, enquanto, para lá dos tangões donde caem os bastidores, fervilham, nos camarins, os mistérios galantes da vida real desse teatro na sua realidade. E, pela frente, nas poltronas de orquestra, nas cadeiras de estofa, nos lugares privilegiados, os críticos d’arte, organizando a claque do entusiasmo, estafam