como a mais delicada creança da cidade, com os olhos negros e expressivos de intelligencia e de doçura, e com os mais formosos cabellos louros que ainda enfeitaram uma cabeça infantil. Não havia n’elles sombra, que desvanecesse aquella côr deslumbrante; reflectia-se-lhes a luz nas ondas, naturalmente lustrosas, como em tenuissimos fios de metal; usava-os soltos e caidos, sem vislumbre de artificio, de um e de outro lado do collo.
Condizia com a expressão angelica do semblante o suave e affectuoso timbre de voz com que falára.
O leitor prevê de certo que é Ermelinda, a filha do Cancella, ou Lindita, como geralmente na aldeia lhe chamavam, a creança que tem na sua presença.
Ermelinda sobraçava um mólho de hortaliça, que fôra colher ao quintal, e dirigia-se com ella para o lar, que o descuido e a indifferença conjugal deixavam ainda apagado áquella hora do dia.
Dando, porém, com os olhos em Augusto, parou, sorrindo-lhe.
— Ai, pois estava ahi, sr. Augusto?! E o meu padrinho talvez sem reparar.
A estas palavras o desditoso marido voltou a cabeça e fitou em Augusto um dos seus desemparelhados olhos.
— Olá, sr. Augusto! Viva! Passe muito bem! Entre; esta casa é sua... De jantar não lhe offereço... porque... porque... Forte desgraça a minha... Olhe! repare para este desaforo!... Venho para casa, morto de trabalho... e vejo o lar apagado! A minha mulher está a ouvir missa, a confessar-se, a commungar... a tomar todos os sacramentos... acho que os está a tomar todos... Louvado seja Deus! Vem ahi tão limpa de consciencia, como eu estou do estomago... Ora, senhores...
— Deixe estar, padrinho... Verá como isto se arranja depressa... Olhe; o lume já está accêso — dizia