— A sr.a morgada? — perguntou Henrique, sem bem saber o que devia pensar da resposta e de tudo que via.
— Sim, senhor; a sr.a morgada, e não tarda aqui. Ella esperava-o.
— Ah! A sr.a morgada esperava-me?
— É verdade — disse a mulher, sorrindo. — Adivinhou que o senhor vinha aqui. E o que é que ella não adivinha?
Henrique dava tratos á imaginação para comprehender esta scena.
— Então é a sr.a morgada em pessoa que...
— Que o convida para tomar uma chavena de chá — disse uma voz por traz d’elle.
Henrique julgou conhecer o timbre d’aquella voz.
Voltou-se, viu a morgadinha que entrava na sala, com o sorriso nos labios e a mão estendida, com aquella habitual franqueza de maneiras, que de tantos encantos a revestia.
Henrique exclamou, admirado:
— A prima Magdalena!
— A morgadinha dos Cannaviaes, se faz favor. Competia-me fazer as honras da minha propriedade, que pelos modos está para ser muito visitada hoje. Chamei, para me acompanhar, a Brizida, que viveu muitos annos aqui com a minha madrinha, e hoje vive em casa sua do rendimento do legado que aquella senhora lhe deixou. A Brizida é quem se encarrega de vir, de quando em quando, abrir as janellas d’esta casa, para que os ratos não a destruam de todo, e os tortulhos lhe não enfeitem as paredes.
— Mas como soube que eu?...
— Isso é um segredo. Não o esperava, porém, tão cêdo, nem imaginei que nos viesse ter assim ao intimo da casa. Fiquei embaraçada quando o vi. Ao principio quasi julguei que era a alma de minha madrinha. Mas fez bem em recolher-se... Ouve?
E com o gesto indicava a chuva, que já batia com fôrça nas vidraças.