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— E beijo as mãos de v. s.^a... Uma desgraçada como eu não podia esperar tanta caridade.

Poucas horas depois a esposa do medico....

— Que tinha morrido de paixão e vergonha, talvez! — exclama uma leitora sensivel.

Não, minha senhora; o estudante continuava n’esse anno a frequentar a Universidade; e como tinha já vasta instrucção em pathologia, poupou-se á morte da vergonha, que é uma morte inventada pelo visconde de A. Garrett no Fr. Luiz de Souza, e á morte de paixão, que é outra morte inventada pelos namorados nas cartas despeitosas, e que não pega nos maridos a quem o seculo dotou d’uns longes de philosophia, philosophia grega e romana, porque bem sabem que os philosophos da antiguidade davam por mimo as mulheres aos seus amigos, quando os seus amigos por favor lh’as não tiravam. E esta philosophia, hoje então...[1]

  1. Hoje então!... Vou-lhes contar um lance memorando d’um philosopho da actualidade, lance unico pelo qual eu fiquei conhecendo a pessoa. Hoje (21 de Setembro de 1861) estava eu no escriptorio do illustre advogado Joaquim Marcellino de Mattos, e um cliente entrou contando o seguinte: — «Senhor doutor, eu sou um lojista da rua de ***; e fui roubado em oitocentos mil reis por minha mulher, que fugiu com um amante para Vianna. Venho saber se posso querelar, e receber o meu dinheiro.» — Póde querelar, respondeu o advogado, se tiver testemunhas. O senhor quer querelar por adulterio? — Responde o queixoso: «O que eu quero é o meu dinheiro.» — Mas, redargue o consultor, o senhor póde querelar de ambos, d’ella por adultera, e d’elle como receptador do furto. — «E receberei o meu dinheiro?» — Conforme. Eu sei cá se elle tem o seu dinheiro?! O que sei é que não póde pronuncial-a a ella como ladra. — «Mas os meus oitocentos mil reis?!» — Ah! o senhor não se lhe dá que sua mulher