Página:Amor de Perdição (1862).pdf/220

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— manda buscar a rapariga, tem-l’a cá algum tempo, e torna depois para onde ao senhor Simão.

— Isso não é d’homem que põe navalha na cara, Josefa. O rapaz, se ella lhe falta, morre de pasmo dentro d’aquelles ferros. Isto é venêta que me deu hoje... Sabes que mais? leve a breca o dinheiro: ámanhã vou ao Porto.

— Pois isso é o que tu deves fazer.

— Está dito! Quem cá ficar que o ganhe. Vão-se os anneis e fiquem os dedos. Por ora tem-se resistido a tudo com o meu braço. A rapariga, se ficar com menos, lá se avenha. Assim o quer, assim o tenha.

Reanimou-se a physionomia do mestre ferrador, e como que os impeços da garganta se iam removendo á medida que planisava a sua ida ao Porto.

Acabára de almoçar, e ficára scismatico, encostado á mesa do escano.

— Ainda estás malucando?! — tornou Josefa.

— Parece coisa do demonio, mulher!... A rapariga estará doente ou morta?

— Anjo bento da Santíssima Trindade! — exclamou a cunhada, erguendo as mãos — que dizes tu, João!

— Estou cá por dentro negro como aquella sartã!

— Isso é flato, homem! vai tomar ar, trabalha um poucaxinho para espaireceres.

João da Cruz passou ao coberto onde tinha o armario da ferragem e a bigorna, e começou a atarracar cravos.

Alguns conhecidos tinham passado, palavreando com