Página:Amor de Perdição (1862).pdf/260

Wikisource, a biblioteca livre

Simão ajuntou a carta de Thereza ao maço das suas, e subiu cambaleando. No convéz sentou-se n’um monte de cordame, e contemplou o mirante de Monchique, que avultava negro ao sopé da serra penhascosa em que actualmente vai a rua da Restauração.

O capitão passeava da prôa á ré; mas com o ouvido fito aos movimentos do degredado. Receára elle o proposito do suicidio, porque Marianna lhe incutira semelhante suspeita. Queria o maritimo fallar-lhe palavras consoladoras, mas pensava comsigo: «O que ha de dizer-se a um homem que soffre assim?» E parava junto d’elle algumas vezes, como para desviar-lhe o espirito d’aquelle mirante.

— Eu não me suicido! — exclamou abruptamente Simão Botelho — Se a sua generosidade, senhor capitão, se interessa em que eu viva, póde dormir descansado a sua noite, que eu não me suicido.

— Mas mereço-lhe eu a condescendencia de descer comigo á camara?

— Irei; mas eu lá soffro mais, senhor.

Não replicou o commandante, e continuou a passear no convez, apesar das rajadas de vento.

Marianna estava agachada, entre os pacotes da carga, a pouca distancia de Simão. O commandante viu-a, fallou-lhe, e retirou-se.

Ás tres horas da manhã Simão Botelho segurou entre as mãos a testa que se lhe abria abrazada pela febre.