Página:Amor de Perdição (1862).pdf/68

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da ceremonia — ha de desculpar que eu viesse assim em mangas de camiza; mas não dei com a jaqueta...

— Está muito bem, senhor João — atalhou o academico.

— Pois, senhor, eu devo um favor a seu pae, e um favor d’aquella casta. Uma vez armou-se aqui á minha porta uma desordem, a trôco d’um couce que um macho d’um almocreve deu n’uma egua, que eu estava ferrando, e em tão hoa hora foi, que lhe partiu rente o jarrête por aqui, salvo tal logar.

João da Cruz mostrou na sua perna o ponto por onde fôra fracturada a da egua, e continuou:

— Eu tinha alli á mão o martello, e não me tive que não pregasse com elle na cabeça do macho, que foi logo para a terra. O recoveiro de Carção, que era chibante, deitou as unhas a um bacamarte, que trazia entre uma carga, e desfechou comigo, sem mais tirte, nem garte. O’ alma damnada! — disse-lhe eu — pois tu vês que o teu macho me aleijou esta egua, que custou vinte peças a seu dono, e que eu tenho de pagar, e dás-me um tiro por eu te atordoar o macho!?

— E o tiro acertou-lhe? — atalhou Simão.

— Acertou; mas saberá v. s.^a que me não matou; deu-me aqui por este braço esquerdo com dois quartos. E vai eu, entro em casa, vou á cabeceira da cama, e trago uma clavina, e desfecho-lh’a na táboa do peito. O almocreve cahiu como um tôrdo, e não tugiu nem mugiu.