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Página:Ao correr da pena.djvu/270

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Decididamente prefiro a noite com as suas estrelas, com o silêncio de suas horas mortas, e as suas sombras pálidas e melancólicas.

É sempre de noite que temos as nossas melhores idéias; e quando se trata de tomar uma resolução importante, ninguém deixa de dormir sobre o caso.

Quanto à poesia, nem falemos. Se quereis sentir, se desejais ter inspirações, passeai de noite ao relento, conversando com as estrelas. Ficareis poeta por força.

O mesmo me aconteceu nessa noite de que vos falei. Conversávamos sobre música, sobre a representação dos Puritanos, sobre o teatro, e de repente senti em mim umas faíscas do fogo sagrado.

Lembrava-me da Charton, e parecia-me ouvir dessas belas volatas que brincam nos seus lábios, que se elevam gradualmente até confundir-se em ondas de harmonias, que morrem a pouco e pouco, e vão perder-se num sorriso ou num tênue suspiro que lhe parte o seio.

Muitas vezes faltavam-nos as imagens. Seria necessário recorrer a todas as artes, materializar o som, colorir a voz, dar corpo à música, para descrever todas as belezas desse canto inspirado.

Assim há umas notas que chamejam, irradiam como chispas brilhantes lançadas no ar; há outras que caem docemente como gota de orvalho da manhã. Umas são brilhantes que desferem raios de luz; outras são flores que exalam perfumes à noite.

Muitas sorriem, brincam com os lábios, aninham-se nas covinhas da boca, fazem mil travessuras, furtam um beijo - e fogem. Algumas suspiram, tremem, vacilam como a lágrima que se desfia pelas faces, palpitam como um seio oprimido, e por fim vem expirar suavemente dentro d'alma.

Às vezes dir-se-ia que o beija-flor se aninha no cálice de uma rosa; outras que bate as suas asas douradas e se lança no espaço, colorindo-se aos raios do sol.

E todos esses arabescos e fantasias brilhantes que vos traça a imaginação, todas essas flores mimosas, esses raios de luz