— E' mentira delle, principe! Não acredite. Nunca fui assim...
— Você de facto nunca foi assim, explicou Narizinho. Mas como dormiu vergonhosamente no serviço, a fada do somno virou você em velha coróca. Bem feito!...
— E por castigo, ajuntou o principe, está condemnado a engulir cem pedrinhas redondas em vez das cem moscas do nosso trato.
O triste sapo derrubou um grande beiço, indo, muito jururú, encorujar-se a um canto. Se não disse: "Que buraco!" foi porque essa expressão não era ainda conhecida naquelle tempo.
III — NO PALACIO
O principe consultou o relogio.
— Estou na hora da audiencia, murmurou. Vamos depressa, que tenho muitos casos a attender.
Foram. Entraram directamente para a sala do throno, no qual a menina se sentou ao lado do principe como se fosse princeza. Linda sala! Toda dum coral cor de leite, franjadinho como musgo e penduradinho de pingentes de perola, que tremiam ao menor sopro. O chão de nacar furta-cor era tão liso que a Emilia escorregou tres vezes.
O principe deu signal de audiencia batendo com uma grande perola de cabo numa concha sonora. O mordomo introduziu os primeiros queixosos — um bando de molluscos nús que tiritavam de frio. Vinham queixar-se dos Bernardo-Eremitas.
— Quem são esses Bernardos? indagou a menina.
— São uns caranguejos que teem o mau habito de se apropriarem das conchas destes pobres molluscos, deixando-os em carne viva no mar. Os peores ladrões que temos aqui.