O peito aspira sofrego ar de vida,
Que da terra não é, qual flôr nocturna,
Que bebe orvalho, elle se embebe e ensópa
Em extasis de amor:
Mais direitas então, mais puras devem,
Calada a natureza, a terra e os homens,
Subir as orações aos pés do Eterno
Para afagar-lhe o throno!
Assim é que no templo magestoso
Rebôa pela nave o som mais alto,
Quando o sacro instrumento quebra a augusta
Mudez do sanctuario:
Assim é que o incenso mais direito
Se eleva na capella que o resguarda,
E na chave da abobada topando,
Como um docél, se expraia.
Eu amo a noite solitaria e muda;
Como formosa dona em regios paços,
Trajando ao mesmo tempo luto e galas
Magestosa e sentida;
Se no dó attentais, de que se enluta,
Certo sentis pezar de a ver tão triste;
Se o rosto lhe fitais, sentis deleite
De a ver tão bella e grave!
Considerai porêm o nobre aspecto,
E o pórte, e o garbo senhoril e altivo,
E as fallas poucas, e o olhar sob’rano,
E a fronte levantada:
No silencio que a véste, adorna e honra,
Conhecendo por fim quanto ella é grande,
Com voz humilde a saudareis rainha,
Curvado e respeitoso.
Eu amo a noite solitaria e muda,
Quando, bem como em salas de banquete
Mil tochas aromaticas ardendo,
Girão fúlgidos astros!
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