crises, como essa que te acabrunha agora. Afirmas não encontrar, por mais que interrogues o teu espírito, causas para tão intenso sofrimento; eu, que tão bem te conheço e há tantos anos, pensei, pensei — e julgo tê-las encontrado. Médica espiritual da tua psicologia ingrata, apresso-me a dizer-te que o teu mal é, talvez, susceptivel de cura.
Investigando mentalmente, recordando factos, reunindo indícios, conclui, minha adorável Lúcia, que essas crises agudas coincidem sempre — é infalível — com qualquer triunfo, grande ou diminuto, de alguma amiga tua; um ligeiro ou sensível progresso de ordem material, um átomo impálpavel de felicidade; um passeio ao Bussaco, um vestido modelo; bagatelas, enfim, que assumem, para ti, proporções esmagadoras.
Interroguei-me, inquieta. Não, não devia tratar-se de mim. Na minha vida não houve, ultimamente, a menor alteração. Não tive herança alguma, não adquiri novas toilettes, ainda êste ano não viajei... Se tens, minha querida, qualquer apreensão sobre o alfinete cravejado de pedras rôxas, que noutro dia viste na banda do meu casaco, calma o teu sobressalto: trouxe-o de Paris, o ano passado, mas é falso, falsissimo; custou-me trinta francos numa lojinha encantadora do Passage Jouffroy.
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