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ENEIDA. — LIVRO I.
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De javali sanhudo? A cinta aljava
Tem sobre a pelle de um manchado lynce.»

Isto Venus; e o filho assim responde:
«Nenhuma ouvi nem vi das irmãs tuas,
345Ó... quem direi? Não tens mortal semblante
Nem voz de humano som; es deusa, ó virgem:
Irmã de Phebo ou nympha? As nossas penas
Tu, por quem es, minora: e nos ensina,
Pois vagueâmos sem saber por onde,
350O paiz, clima ou povo, a que arrojou-nos
Vento e escarcéo medonho. Hostias sem conto
Havemos de immolar nas aras tuas.»

«Não mereço honras taes, replíca Venus;
Usam de aljava, e ao bucho as virgens tyrias
355Atar das pernas borzeguim purpúreo.
Punicos reinos e agenorios muros
Vês, nos confins da indomita e guerreira
Libyca raça. O imperio atêm-se a Dido,
Que, por fugir do irmão, fugiu de Tyro.
360He longa a injúria, tem rodeios longos;
Mas traçarei seu curso em breve summa.

Sicheu, Phenicio em lavras opulento,
Foi da misera espôso, e müito amado:
Com bom preságio o pae lha dera intacta.
365Pygmalion, façanhoso entre os malvados,
Barbaro irmão, do estado se empossara.
Interveio o furor: de fome de ouro
Cego, e á paixão fraterna sem respeito,
Perfido, impio, a Sicheu nas aras mata;
370O facto encobre, e a credula esperança
Da amante afflicta largo espaço illude
Com mil simulações. Mas do inhumado
Consorte, com esgares espantosos,
Pallida em sonhos lhe apparece a imagem:
375Da casa o crime e trama desenleia;