Página:Eneida Brazileira.djvu/94

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D’haste aguda o só lume lhe furamos,
Na torva testa occulto, e na grandura
Broquel argivo ou lampada phebéa.
Sus a amarra picai, fugi, mesquinhos;
665Pois taes, qual Polyphemo em antro escuro
O lanigero gado amalha e munge,
Moram Cyclópes cem por essas praias,
Descompassados pelos montes vagam.
Tres luas tem de luz enchido os cornos,
670Dêsque entre brenhas por covis me arrasto,
De um sêrro espreito os monstros, e estremeço
Do estrupido e da voz. Misero pasto,
Colho bagas, pilritos lapidosos,
De herva e raizes arrancadas vivo.
675Sempre álerta, avistando a frota vossa,
De ir-me a ella assentei, qualquer que fôsse:
Não he pouco evadir-me á gente infanda.
Matai-me, se o quereis; prefiro a morte.»
Nem acabava, e n’um cabeço vêmos,
680Entre os gados movendo a vasta mole,
O pastor Polyphemo, ás notas praias
A descer; monstro horrendo, informe, ingente,
A quem vazou-se o ôlho, e tenteando
N’um pinheiro esgalhado se abordoa.
685Grei lanosa o acompanha, o só deleite,
O allívio seu: do collo a flauta pende.
Depois que as aguas toca e mais se engolpha,
Do ôlho escavado lava o humor cruento,
E a gemer range os dentes. Já no meio
690Anda, e as altas espadoas não molhava.
Accelerando a fuga, o supplicante
Com razão recolhido, nós cortamos
Tacitos as amarras, e encurvados
Remando á competencia, o mar varremos.
695Sentiu-nos, e ao sonido os passos torce.