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essa separação que lhe rompia as fibras mais intimas. Dez dias eram passados e ella ainda não vira Theophilo. Escrever-lhe sómente, lhe não bastava, não a consolava, não lhe saciava a avidez inexoravel de sua alma por essa outra alma semelhante á sua...

Oh! se ella pudesse, ao menos vel-o, parar seus olhos em o mysterio de suas pupillas adustas, depôr em seus labios adorados, esse beijo feito de mil beijos, essa eclosão maravilhosa, exuberante, profunda de seu amôr...

Obsedada por essa ideia, Ladice certa manhã, antes de ir para a casa de sua mãe, foi á “garçonnière” de Theophilo. Elle havia saido. “Qu´importa!” — disse ella, entrando. Ao transpôr a porta de seu quarto, em essa atmosphera saturada de recordações doces e subtis, a Senhora de Assis sentia surgir-lhe em a imaginação excitada, Theophilo, o seu amôr, o seu esto, a violencia de suas desordens, as contracções de suas mãos apaixonadas... Sem curiosidade, sem vontade, sem pensamento, morta, vertiginosa, porém deslumbrada d´elle, não fazia senão olhar ao redor, contemplar esse desalinho elegante, essas gavetas remexidas, essas rosas que principiavam de emmurchecer, esse abandono suggestivo como murmurios de amôr, esse dolman branco, cheio d´elle, de seus movimentos, de sua agitação... Com um gesto de amôr ella desprendeu da cintura as angelicas que trazia, e depositou-as sobre o travesseiro de Theophilo, dizendo: “Lembra-lhe pelo teu perfume, pela tua carnação feminil a brancura diaphana de minha pelle...