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alma, dividida em innumeros fragmentos, sem consistencia, sem unidade, vagava da certeza do irrealizavel á confiança no acaso.

Clamou, rezou, rogou a Deus com fervor de hysterica; fez promessas estravagantes; chegou a offerecer à sua vida por um anno de felicidade, a dois.

Era, porém, na tranquilidade da noite, accordada, fitando a escuridão, meio recostada nas almofadas, que ella vivia a sua vontade dominadora, a sua emoção exclusiva: transportava-se, então, ao seu lado, acompanhava-lhe os passos, balbuciava-lhe palavras de amor, acariciava-lhe a fronte magnifica, repousava a cabeça sobre o seu hombro masculo e forte, detinha a bôca junto de sua bôca, como a eternidade amorosa, demente, tenaz, deante da immortalidade... E assim continuava, voltava, saboreava, repisava os mesmos pensamentos até que extenuada, adormecia.

Nos livros, nos cadernos, na folhagem verde, nas corollas, na rugosidade dos troncos, nas asas das libellulas, entrelaçava os seus nomes, confundia as suas iniciaes.

“Thêo meu!” — saia-lhe dos labios constantemente. Ora, era uma súplica, um gemido, uma explosão, ora, a finalidade radiosa, a interjeição festiva, o corollario de uma affirmação.

Ao ler a noticia de seu casamento, Ladice accrescentou as seguintes linhas em seu “Diario”:

“Agosto,

Todas as lagrimas da separação, todas as flôres dos mortos me cobrem a alma... Atravessa-me os olhos a côr sombria, funerea, das vagas tormentosas...