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emmaranhando-se, multiplicando-se indefinidamento todas as sombras merencorias...

Essa transição, essa nova nova phase de Theophilo embutia em a fantasia amorosa de Ladice, excessos ineditamente torturantes: dir-se-ia que em suas sensações se rasgavam ascendencias brancas, rubores imprevistos, estridencias insubmissas...

Certo dia surprehendendo seu amante em attitude de profundo abatimento, devido a uma noite de insonias e de elaborações exasperadas, em que pensamentos se creavam e se destruiam celeres, Ladice foi tomada de forte commoção. Subtil, silenciosa, esgueirou-se pela sala e ajoelhou-se aos pés de Theophilo. As suas mãos pallidas e finas se espalmavam sobre o peito do Bem amado, á guisa de corações em extase... O seu perfil se voltava para elle tenso, afiado, agudo, levando-lhe em as bordas, a alma transida... Sentia-lhe o mysterio surgir, vir a ella, roçar-lhe o ser, como a efflorescencia de suas excepções suprêmas, do seu eu metaphysico, secreto: violaceos eram-lhe os gestos, a linda cabeça, os olhos, as caricias de seus labios. Ladice testemunhava em a sua impassibilidade apparente, em o estiramento ligeiro da boca, na sua lividez, na agonia das pupillas, os fragores, os bramidos de um amor implacavel, encarniçado e a mais atroz e louca e vezana das volupias humanas: o espirito que ama e quer haver a sensação physica do ardor...

Theophilo desvairado, tomou-a em os braços, e assim irmanado, fazendo um só, invocava a misericordia de Hera e de Teleia para que lhes dessem o ultimo goso, a ultima volupia: a morte a dous.