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— A tua melancolia, Thêo, é o teu traço mais estuante — dizia-lhe mais tarde Ladice trazendo o echo doloroso das grandes violencias.

Outra vez após instantes ruidosos, beijando a fronte do amante, sob a sombra movediça e esguia de seus cabellos febris, Ladice murmurava-lhe baixinho, a voz entre-cortada:

— Ah, Thêo, ri, ri, eu te supplico. A minha alma se détem em as contracções de um louco paroxysmo. — E a sua cabeça rolou-lhe, exangue, ao hombro.

Theophilo sentia em esse corpo que se estirava obliquo, a avidez, o desespero, a alucinação estereis que agitam os homicidas encarcerados, retidos, para o crime, para o exterminio, para as tragedias sangrentas que lhes são vedados.

— “O´ symbolo das cousas inertes: E´s a vontade, o espaço, a immensidade, a voragem a exorar plenitudes, inteirezas, totalidades... O teu espirito se levanta com sedição tacita, immoderação, ancia, brado de vacuo interminavel... Oh! minha anormalidade unica, extraordinaria, precursora, ante a qual o poderio humano, estaca impotente... Oh! delirio infecundo, arido, porque te não hei, assim mesmo cortante e sevo...

A imaginação bizarra de Theophilo pairava sobre ella attenta, perplexa, encandescida. A sua veneração, o seu respeito, o seu orgulho, a sua humildade iam-lhe ao encontro, se azougavam ante essa morbidez nova, virgem, superior de sua amante. Era a primeira vez que elle via uma intelligencia possuida de paixão, em embates para as convulsões da grande sensação...