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E ella passou a carta a João que, instantes antes, viera á sua procura:

— Ah! Ladice, que seducção terrivel! Que peccado rubro e flammante, que impeto desassisado... E´ a instancia mais formidavel, mais incisiva de amôr que hei jamais lido... Se eu recebesse uma missiva assim, abandonaria tudo e viria de rojo aos teus pés, reclamar-te... E os olhos se fixaram em sua prima. — Pobre Theophilo, pobre Poeta! é bem capaz de um crime — repetia elle.

Apesar da frivolidade de seus sentimentos, João descia até a sublimez d´esse amor, sentindo-lhe a potencia, a supremacia, a fatalidade.

Ladice se retirou para o quarto. Achava-se fatigada; apesar de seus esforços aquella phrase de João dita em o passeio, laborava em seu intimo, cortava-a, com a fugacidade de relampago.

O resto da tarde, ella o passou a engendrar, a fabricar, a urdir uma surpresa de arte para Theophilo.

Ladice queria vel-o enlaçado de agonias indiziveis; queria despertar-lhe em massa, as sensações, os instinetos, a imaginação, o estranho; queria testemunhar-lhe o assombro, o estupor em trilhando as abas do encantamento; queria assistil-o immovel a debater-se em o chaos multiplo de seus extremos de poeta e de estheta. —E ella se dizia “Elle sentirá o mesmo abalo que sacudiu a terra quando um Deus morreu...”

No dia seguinte depois da partida de João para o Rio, Ladice se atirou nos braços de seu amante, dizendo-lhe:

— A tua Musa traz a fome de todas as eternida-