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Mas Ladice não podia guardar para si só essas palavras que cresciam, se avolumavam, se distendiam, se desdobravam incessantes, suffocando-a, avassallando-a... Era-lhe mistêr communical-as, transmittil-as a alguem, commental-as com outrem, pesar-lhes o valor, vestil-as de sons novos, ouvir-lhes o tilintar.

Essa mesma tarde, após o jantar, emquanto passeavam pelas aleas aromatizadas do jardim, ella contou á Dinah. Em o fazendo, porém, não conseguia velar, dominar a ebriez que lhe estagnava no senso. Ella tinha a impressão de ser rosa da Palestina, com as suas cento e cincoenta folhas em flammas, trespassadas de flexas, de rythmos, de lendas mortas...

Dinah d´Elvas, apesar de certa ingenuidade, sentia o paganismo, a peccaminosidade d´essa paixão, e, como virgem destinada ao Senhor, assustava-se, alarmava-se pela salvação de sua prima, quasi irmã. — “O amor que Deus abençôa é o amor calmo, tranquillo, commedido”, Ella mesma, quando rezava ante o Santissimo, seu coração se enternecia de amor para Jesus, mas de um amor que era uma especie de melodia sacra, um “Kirie”... — pensava ella,

Seu fervor redobrava para que Ladice recebesse, qual baptismo de pureza, as auras santas do Jardim das Oliveiras; para que seu exterior fosse menos flôr, menos claridade, menos estranho, severo, modesto, singelo, qual habito de freira; para que seus olhos perdessem o calor do estio, tivessem a paz da renuncia; para que sua paixão se divinizasse, e sua alma de vibrações e coloridos intensos se impregnasse de beati-