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geral. É uma obra inteiramente pessoal em relação no meio literário de então. Antes de ninguém, pratica no romance brasileiro e pode afirmar-se que a pratica com suficiente engenho, mais que a pintura ou notação superficial, a observação a que já é lícito chamar de psicológica do indivíduo e do meio, a descrição pontual, sem preocupações de embelezamento dos costumes e tipos característicos, a representação realista das cousas, sem refugir, o que haveria escandalizado a Macedo e Alencar, mesmo aos seus aspectos mais prosaicos e até mais repugnantes, mas evitando sempre tanto as cruezas que trinta anos depois haviam de macular o naturalismo indígena, no seu grosseiro arremedo do francês, como os fingimentos e afeites com que presumiam aformosear a nossa vida e a sua literatura os romancistas seus contemporâneos. A língua e o estilo deste romance, menos trabalhados que o de Alencar e menos desleixados que os de Teixeira e Sousa e Macedo, tem, se não maior correção (e a sua é certamente maior que a destes últimos), mais fluência e espontaneidade e mais personalidade.

Acaso foram estas feições, que hoje revelam aos nossos olhos este romance, a causa dele não ter tido na nossa literatura a influência merecida. O gosto e a inteligência do público àquela data iam preferentemente às qualidades opostas às que agora nos parecem constituir o mérito. Habituado ao romance romanesco e moralizante qual era não só o nosso, mas o português nessa época, em rever-se embevecido nas concertadas criações dos seus romancistas, não se podia o público enfeitiçar com um romance que para o seu gosto tinha o defeito de ser demasiado real e desenfeitado. Este seria também o sentimento dos próceres do Romantismo, então com toda a autoridade na opinião literária nacional. Parece indicá-lo o fato do Brésil littéraire, de Wolf, sabidamente inspirado por Magalhães e Porto Alegre, não aludir sequer às Memórias de um sargento de milícias, e ao seu mal-aventurado autor, nem o representar na antologia, onde tanta cousa péssima vem,