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Já Vicente terminara a convalescença quando recebeu uma carta de Davi.

Aproximava-se o tempo marcado para a volta do poeta, e a carta fez-lhe supor que o poeta não voltaria ainda.

— Para que me escreveria se voltasse já?

Abriu a carta e leu-a:

Meu caro amigo. Dentro de pouco estarei aí e então para nunca mais fazer viagem alguma.

Nunca lhe disse que havia em minha vida alguns desgostos a respeito dos quais nunca procurava conversar? Pois saiba que um deles foi o que me trouxe cá.

Ficou-me de minha mulher um filho a quem eduquei com desvelo paternal.

Prometia ser até à idade dos quinze anos um modelo de retidão e de sisudez.

Más companhias o perderam. Tendo chegado a uma certa idade em que o olhar paterno não podia segui-lo em toda a parte, o rapaz esqueceu as lições que eu tanto lhe ensinei e deixou-se levar pela torrente da rapaziada.

De perdição em perdição este filho chegou a sair-me de casa e a desconhecer até a minha autoridade.

Separamo-nos.

Ora, imagine que tive ultimamente um sonho e que se me afigurou ver o rapaz contrito e morigerado pedir-me a bênção paternal.

Não hesitei um momento. Vim ter ao lugar onde em natural encontrá-lo e vi a realidade do meu sonho...

Lá vou ter dentro de poucos dias. Esperem aí o velho amigo. Davi.

Conforme dizia a carta, apareceu no fim de pouco tempo o nosso poeta. O sinal da chegada de Davi foi a presença de Diógenes na horta de Vicente. O cão acompanhara o senhor.

Sabendo da presença do vizinho, Vicente lá foi ter e abraçá-lo; contou-lhe o que sofrera, os perigos de que escapara e até os atos de dedicação e amor da parte de Emília.

E, concluindo a narrativa, disse Vicente:

— Enfim... já é para agradecer que me salvasse e esteja aqui livre de tudo, disposto a recomeçar os meus trabalhos... Mas, então, encontrou seu filho?

— É verdade, respondeu Davi.

— Foi um verdadeiro achado... não?