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Página:Lendas e Narrativas - Tomo I.djvu/253

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elrei me fala sempre de vós em suas cartas. Não sois cavalleiro de sua casa? E a avultada tença que vos concedeu em paga da obra que traçastes, e dirigistes, em quanto Deus vos concedeu vista, não prova que não foi ingrato?”

“Cavalleiro!?”—­bradou o velho—­“Com sangue comprei essa honra! Comigo trago a escriptura.”—­Aqui mestre Affonso, puxando com a mão tremula as atacas do gibão, abriu-o e mostrou duas largas cicatrizes no peito.—­“Em Aljubarrota foi escripto o documento á ponta de lança por mão castelhana: a essa mão devo meu foro, que não ao Mestre d’Aviz. Já lá vão quinze annos! Então ainda estes olhos viam claro, e ainda para este braço a acha d’armas era brinco. Elrei não foi ingrato, dizeis vós, veneravel prior, porque me concedeu uma tença!?—­Que a guarde em seu thesouro; porque ainda ás portas dos mosteiros e dos castellos dos nobres se reparte pão por cégos e por aleijados.”

Proferindo estas palavras, o velho não pôde continuar: a voz tinha-lhe ficado presa na garganta, e dos olhos embaciados cahiam-lhe pelas faces encovadas duas lagrymas como punhos. A Fr. Lourenço tambem se arrasaram os olhos d’agua, Frei Joanne, esse olhou fito para o cégo durante algum tempo com o olhar