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Página:Lourenço - chronica pernambucana (1881).djvu/47

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— Diabos levem a vida de soldado. E eu que já quis sentar praça! Deus me livre. Antes ser negro cativo.

Os dissabores de Marcelina foram maiores. Esperava o marido com o coração transbordando de alegrias, e em vez de consoladoras doçura, recebeu o fel da prolongação da ausência por tempo indefinido. Mas logo caiu naquele espírito privilegiado o bálsamo da resignação.

— Que hei de fazer, meu Deus! Tanta promessa pedida a Nossa Senhora do Rosário, a Santo Cristo dos Milagres, ao Bom Jesus dos Martírios. Os meus merecimentos não são nenhuns. Que hei de fazer?!

E voltou-se de corpo e alma ao trabalho, sua esperança, sua fé, sua consolação.

Uma tarde, já em 1712, chamou Lourenço e disse-lhe:

— Vamos aumentar o puxado, que já não tenho onde botar as esteiras novas que acabei. Estou vendo a hora que os ladrões vêem furtá-las do alpendre.

Sendo já quase sol posto. Lourenço, para não se expor e anoitecer dentro da mata, lembrou-se de aproveitar a madeira da casa queimada, que se estava perdendo ao tempo. Pegou de um ferro-de-cova e uma enxada, e encaminhou-se às ruínas. Por baixo de um grande entulho, formado pelo barro das paredes e por pedaços de estacas que a força do vento e das chamas havia atirado em uma só direção, apareciam as pontas de uns caibros que não alcançara o fogo.

Era talvez este o único entulho que não tinha sido bulido.