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um dos primeiros a atravessar os rochedos, cortando para isso vagas tão altas como montanhas.

Puz pé em terra. Mas a dôr por perder o meu pobre Carniglia, deixando-me indifferente sobre a minha propria sorte, dava-lhe uma força invencivel.

Apenas tinha posto pé em terra que me voltei movido por uma derradeira esperança.

Póde ser, ir vêr Luiz.

Interroguei todas essas figuras assustadas, mas todas me davam a mesma resposta. Já não me restava esperança alguma.

Vi então Eduardo Mutru, que depois de Carniglia era quem eu estimava mais, e a quem tinha passado um fragmento da escotilha recommendando-lhe que se agarrasse com toda a força. A violencia das vagas tinha-lhe, sem duvida, tirado este apoio. Ainda nadava, mas pela convulsão dos seus movimentos indicava a extremidade a que se achava reduzido. Já disse como o amava, era pois o segundo irmão que ia perder no mesmo dia. Não quiz em um momento perder tudo o que mais presava no mundo. Lancei ao mar os restos do navio que me tinham servido para ajudar a ganhar a praia, e lancei-me de novo ao mar, indo novamente affrontar um perigo ao qual tinha poucos momentos antes escapado. No fim d’um minuto só algumas braças me separavam de Eduardo.

— Coragem... Coragem, lhe disse eu.

Vã esperança, vãos esforços! No momento em que encaminhava para elle o pedaço de madeira salvadora desappareceu.

Dei um grito, e mergulhei. Depois não encontrando o meu pobre amigo julguei que teria vindo á superficie. Voltei tambem: Ninguem! Mergulhei de novo e de novo voltei ao cimo d’agua. Dei gritos desesperados, mas tudo foi em vão. Eduardo Mutru tinha tambem sido engolido por esse Oceano que elle não tinha tido receio de atravessar para, unindo-se-me, servir a causa dos povos.