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MEMORIAS DE UM NEGRO
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quisitas sobre o modo de festejar o nascimento de Jesus. Numa cabana cinco meninos dividiam um pacote de bombas; em outra seis pessoas rodeavam uns bolos minguados; adiante havia dois ou tres pedaços de canna de assucar para uma familia inteira; mais longe o ministro da localidade e sua esposa, junto a um pote de aguardente ordinaria, emborrachavam-se dignamente. Vi sujeitos que se divertiam muito olhando gravuras de reclame. Outros haviam comprado pistolas novas. Nada que nos fizesse pensar no Salvador do mundo. O trabalho suspenso, os campos abandonados, toda a gente passeando pelos caminhos. Á noite havia danças, danças primitivas que, depois de abundante cachaça, findavam em tiros e navalhadas.

Um negro que encontrei nessa visita, velho e pastor, asseverou-me, citando a Biblia, que era peccado trabalhar. Deus, no Eden, havia amaldiçoado o trabalho, razão por que o descanço era recommendavel. Naquelle momento esse honrado pastor se sentia feliz, pois ficava uma semana sem peccar.

Na escola procurámos ensinar aos nossos alumnos outra maneira de celebrar decentemente o Natal. Obtivemos excellente resultado: a festa ganhou para elles uma significação nova. Agora os estudantes empregam a semana de ferias em actos de beneficencia. Como exemplo, menciono a reconstrucção da cabana duma pobre negra enferma,