brava-me de ter enforcado o gato n'um jardim adjacente á casa. Aos gritos de alarme aquelle jardim havia sido immediatamento invalido pela vizinhança. Provavelmente, alguem tinha despendurado o gato e atirado com elle pela janella aberta, para dentro do meu quarto, sem duvida com o fim de me accordar. A queda das outras paredes tinha comprimido a victima da minha crueldade na substancia do estuque fresco. A cal combinada com as chammas e o ammoniaco tinham assim produzido a imagem, tal como eu a via.
Bem que a razão, se não a consciencia, ficasse satisfeita com aquella explicação, o facto surprehendente que acabo de narrar, não deixou de produizir em mim uma impressão profunda. O phantasma do gato perseguiu-me muitos mezes; e durante esse periodo, voltou-me á alma um meio sentimento, que parecia ser, mas que não era remorso. Cheguei a deplorar a perda do animal e a procurar pelas espeluncas, por onde agora andava, um outro favorito da mesma especie e de uma figura parecida, para o substituir.
Uma noite em que eu estava assentado, meio bebado, n'uma tasca mais que infame, a minha attenção foi subitamente attrahida para um objecto negro, collocado sobre um dos immensos toneis de gin ou de rhum que constituiam a mobilia principal da sala. O que me surprehendeu foi que, estando eu a olhar para o topo do tonel, haveria ja uns seis ou sete minutos, só agora houvesse descoberto o que lá estava em cima. Approximei-me e toquei-lhe com a mão. Era um gato preto, enorme, pelo menos do tamanho de Plutão; exactamente semelhante a elle, excepto n'um ponto. Plutão não tinha um pello branco em todo o corpo e aquelle tinha uma grande malha branca, mas de uma fórma indecisa, que lhe cobria toda a região do peito.