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Página:O Barao de Lavos (1908).djvu/109

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do doente, como n’uma esterqueira os cogumelos.

Não se ia operando sem lucta a ruina pathologica do barão. Nas breves, espaçadas horas de reflexão e de repouso, a consciencia d’este pobre Belisario dos sentidos, activada por uns leves fogachos de rehabilitação moral em que a porção nobre do seu atavismo se inflammava ainda, punha-se a illuminar-lhe de alto as perturbações ignominiosas da alma, com a serenidade do luar que rompe a esclarecer, n’um claro de procella, a caligem estertorosa e revolta d’um mar atormentado. Então o barão via-se por dentro, media com horror toda a profundidade obscena do seu aviltamento, chegava a desprezar-se; e reunindo n’um esforço heroico as suas reacções pundonorosas, conseguia, amparado n’ellas, dominar as fatalidades do sangue, travar o desmoronamento, reconquistar a propria estima.

Assim antes como depois de casado, era-lhe frequente topar por acaso, de noite, a uma quina de rua, no parapeito d’um caes, no mosaico d’uma praça, com o vulto escorregadio e sujo d’algum vadio em almoeda. Logo se lhe aphrodisiavam os nervos e se lhe congestionava o desejo. D’ahi, troca de olhares de intelligencia, o dialogo entabolava-se, aprazava-se ponto de reunião... mas já depois, no caminhar para o gyneceu combinado, vinha uma d’essas reacções salvadoras, os seus restos de brio fidalgo despertavam, sacudia-o um repellão de bom-senso, córava na sombra, tinha um medo vago de si mesmo... e parava de repente. O rapaz, que ia na frente, parava também, desconfiado. Chamava-o o barão, dava-lhe uma bôa espor-