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O reino de Kiato
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milia, fareja as porcentagens das multas, impondo-as sem criterio, como um animal esfomeado por um repasto. Sua fiscalisação não attinge aos grandes contrabandistas, aos furtadores do erario, porque estes são grandes senhores, que se banqueteam com os ministros...

Paterson ouvia maravilhado a narrativa. Sentia-se reviver. Aquelle ambiente, saturado de uma moral tão sã, o viver d’aquella gente, que havia realisado o ideal do homem — a paz do espirito ao lado da saude do corpo, a vida sem dores emfim — prendiam-no a Kiato.

Não foi a civilisação que corrompeu o homem, a sua vida em sociedade, mas os vicios que se desenvolveram com ella. E a prova estava na pureza de costumes daquella gente, duzentos annos depois de ter eliminado de seu seio o factor de todos os vícios e da miseria humana.

— Deixar Kiato — dizia Paterson a Robert — depois de ter vivido na mais liberal das republicas, onde o homem é feliz porque cumpre os seus deveres e respeita o direito dos outros homens, na terra em que o crime era o apanagio de seus habitantes e desappareceu por completo com a reforma radical de seus usos e costumes, deixar Kiato é-me impossivel. Como viver em outra qualquer parte do mundo? Os povos de outras latitudes têm a illusão de que são perfeitos, mas, comparados com este reino, são vis e miseraveis hottentotes.

E Paterson resolveu ficar em Kiato.