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O PRECURSOR DO ABOLICIONISMO NO BRASIL
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sileiro. Este navio escapa ao perigo que o ameaça e consegue entrar, em paz, no porto... Este quadro é de pintura recentissima”.

Fazia, nessa ocasião, mais de vinte anos que nós, solenemente, reconheceramos, em tratados internacionais, que o comercio da carne humana era imoral e ilegal e nos obrigaramos a combatê-lo, a reprimí-lo, a tudo fazer para extinguí-lo. Isso, porem, era nos tratados e, no caso, exclusivamente “para inglês ver”. Na realidade, mantinhamos o deshonroso tráfico, protegiamos escancaradamente os negreiros de maior evidência e acudiamos ás embarcações em perigo de cair nas mãos dos caçadores implacaveis de contrabandistas de escravos. Não nos passava pela mente cumprir o prometido e só o fizemos — confessemos a dolorosa verdade — quando, premidos pelas incursões inglesas, ultrajados e diminuidos em nossa soberania, afrontados dentro de nossa própria casa pelas forças navais britânicas, Eusebio de Queirós deu ao Brasil a lei de 1850. Mas, antes de ser cumprida com o rigor e a honestidade com que o fez o integro estadista, a mentalidade escravocrata ainda tentou agarrar-se ás suscetibilidades patrióticas, humilhadas pela grosseria e pela brutalidade anglicana, para tentar, com esse último e desesperado expediente, prolongar e protelar a vigência do tráfico. Não havia motivo de espanto. Si nós haviamos até ali mercadejado com a carne humana, porque recuariamos em explorar e especular com um sentimento sagrado como o patriotismo?