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Página:O precursor do abolicionismo no Brasil.pdf/232

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SUD MENNUCCI

grande esquife quadrado, ou em alguma espaçosa sepultura. Desgostava mais do que entristecia. Se o gosto dos mortos se consultasse, Luiz Gama quizera que o seu corpo fosse bucolicamente estendido ao ar livre, á sombra de uma bela arvore cheia de passarinhos e peneirando flores, guardado por alguns bons amigos, cercado da surdina longinqua, indistinta da natureza viva e selvagem... Porque se havia de privar aquele pobre morto da claridão generosa daquela manhan? Eu fui a uma das janelas e abri-a um pouco. Um raio de claridade pura entrou pela sala e foi até o esquife, como um menino inocente e curioso. Exatamente nessa ocasião, invadiram o recinto mortuario um bando de meninas que iam á escola, com as suas ardosias velhas e os seus cadernos enegrecidos e as caixanhas de costura á ilharga... Examinaram o morto e retiraram-se logo, caladas e timidas. Depois entraram sucessivamente amigos do finado, negros, que ele libertára, vizinhos que o prezavam. Todos, com um raminho de alecrim que havia por perto num copo, respingavam agua benta sobre o cadaver. Um deles acercou-se da eça e descobriu o rosto do morto. A fisionomia calma não perdêra o seu ar imponente. Apenas sentiu-se como que um resecamento da pele. Na vespera, um escultor fizera em gêsso, um molde do semblante do cadaver. Nota-se tambem um ou outro vestigio do gesso. No mais, era a mesma aparência veneravel, distinta, serena, marmorea... Assim pelas tres horas, começou a atividade precursora do saimento. Principiou a encher-se de gente a casa. Na rua parava-se, a olhar para o reposteiro negro