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Página:O precursor do abolicionismo no Brasil.pdf/234

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SUD MENNUCCI

tada, saudou a aproximação do feretro com uns acordes lagrimosos, umas notas surdas que pareciam chegar do horizonte, ou das nuvens. Ritmados pela cadencia daquela musica, foram-se os passos da multidão pela estrada acima. Um silencio mortal rodeava o finado, sendo apenas interrompido pelos que pediam que lhes deixassem tambem carregar o esquife. Por cima do prestito flutuavam os esplendores de uma tarde olimpica. O sol batia de rijo sobre as cabeças descobertas e dourava a poeira espessa que levantava-se da estrada. Para longe fugiam os campos do Carmo, muito verdes, rasgados em varios pontos pelos extravasamentos do Tamanduateí, alagados em grandes espelhações cintilantes. Da linha do horizonte erguiam-se colunas azues de fumaça, que dissolvia-se pela transparencia imaculada da atmosfera. Em frente alinhava-se, como em cerrado pelotão, a casaria da cidade. As habitações sobrepostas pelos outeiros de São Paulo, pareciam apertar-se para espiar o prestito. As torres, satisfeitas da sua estatura, olhavam, sem esforço, por cima dos telhados. E a procissão avançava. E a banda de musica ia desfolhando adiante do esquife as suas harmonias roxas e soluçantes. Na ladeira do Carmo, a irmandade de Nossa Senhora dos Remedios, para cujos fins de beneficiencia o defunto concorrêra um dia, veiu encontrar o enterro, com as opas de azul e branco e suas enormes velas, grossas como cajados. Ao entrar na cidade, uma comissão de seis membros do Centro Abolicionista de São Paulo tomou as alças do caixão. A cidade estava triste. Inumeras lojas tinham as portas fechadas, em manifestação de pezar;