Página:Obras de Manoel Antonio Alvares de Azevedo v2.djvu/314

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nuvem ante meus olhos, como aos daquele que labuta na trevas. A sede da vida veio ardente: apertei aquele que me socorria: fiz tanto, em uma palavra, que, sem querê-lo, matei-o. Cansado do esforço desmaiei.

Quando recobrei os sentidos estava num escaler de marinheiros que remavam mar em fora. Aí soube eu que meu salvador tinha morrido afogado por minha culpa. Era uma sina, e negra; e por isso ri-me; ri-me, enquanto os filhos do mar choravam.

Chegamos a uma corveta que estava erguendo âncora.

O comandante era um belo homem. Pelas faces vermelhas caiam-lhe os crespos cabelos loiros onde a velhice alvejava algumas cãs.

Ele perguntou-me:

— Quem és?

— Um desgraçado que não pode viver na terra, e não deixaram morrer no mar.

— Queres pois vir a bordo?

— A menos que não prefirais atirar-me ao mar.

— Não o faria: tens uma bela figura. Levar-te-ei comigo. Servirás...

— Servir! — e ri-me: depois respondi-lhe frio: deixai que me atire ao mar.

— Não queres servir? queres então viajar de braços cruzados?

— Não: quando for a hora da manobra dormirei: mas quando vier a hora do combate ninguém será mais alente do que eu.