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Lucia Maria Bastos Pereira das Neves Os esquecidos no processo da Independência: uma história a se fazer

Almanack, Guarulhos, n. 25, ef00220, 2020

http://doi.org/10.1590/2236-463325ef0022

portugueses em jacobinos radicais, com o efeito evidente de acirrar a animosidade já presente contra as Cortes.

Assim, vários redatores portugueses contrários à cisão entre Brasil e Portugal traziam à tona o temor de uma revolta de escravos, como José Liberato de Carvalho, redator de O Campeão Português em Lisboa[1]. Em seu ponto de vista, a possibilidade de independência naquele momento era uma ideia prematura, uma vez que nem todas as províncias estavam de acordo com essa separação, o que podia acarretar perigos fatais. O novo governo do Brasil seria débil e fraco, porque havia “naturais barreiras” que separavam as províncias e a possibilidade de uma guerra civil, da qual poderia facilmente decorrer o desmembramento do país. Essa guerra civil, na opinião de O Campeão, despovoaria e arruinaria todas as riquezas da preciosa agricultura do Brasil. Além disso, haveria de expor o Brasil ao

mais fatal de todos os perigos, que é o passar de senhor a ser escravo; ou a ter por senhores esses mesmos escravos africanos e negros, que por hora só pode conter apoiado na antiga e venerada égide do poder de Portugal. Com efeito, quem, como o Brasil tem atualmente dentro de si tão poderosa gangrena política, não pode em seu juízo perfeito ou ainda com o mais pequeno amor da pátria, expor-se ao perigo funesto de ver reduzido seu belo país a uma bárbara colônia de negros Africanos.[2]

E, para melhor elucidar suas opiniões, citava o “exemplo terrível” do Haiti, tentando espalhar um medo social entre as elites dirigentes, que viviam em um país em que “há seis escravos, ao menos, para um senhor”[3].

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Forum

  1. O CAMPEÃO PORTUGUÊS OU O AMIGO DO POVO E DO REI CONSTITUCIONAL. Lisboa, v. 1, 1822.
  2. Ibidem.
  3. Ibidem. Cf. também o escrito de MENEZES, Francisco d’Alpuim. Portugal e o Brazil: observações politicas aos ultimos acontecimentos do Brazil. Rio de Janeiro: Imp. Nacional, 1822, p. 14, grifo nosso: “Quem lhe afiançaria que o pavoroso flagelo da anarquia, esta assoladora peste das sociedades, não arvorava o seu negro pavilhão?”.