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Lucia Maria Bastos Pereira das Neves Os esquecidos no processo da Independência: uma história a se fazer

Almanack, Guarulhos, n. 25, ef00220, 2020

http://doi.org/10.1590/2236-463325ef0022

Baseado nas profecias de Bandarra, que considerava “sumamente verdadeiras”, embora misteriosas, pois não se equivocavam em um só ponto dos fatos premeditados, Antônio Barbosa fazia uma extraordinária interpretação do processo de separação do Brasil de Portugal, diferente de todas as outras. Para ele, a Independência do Brasil assegurava a continuidade dinástica, a legitimidade, a soberania popular e um aspecto messiânico-providencialista. De um lado, o processo acarretava laços estreitos com um projeto revolucionário, idealizado, em grande parte, pela Maçonaria. De outro, a Independência mostrava-se muito mais do que uma simples ruptura com Portugal. Ao instaurar um modelo de poder envolto em mística profética e apocalíptica, que pretendia “materialmente Divino”, o Brasil convertia-se em “um novo Portugal”[1]. Desse modo, a Independência do Brasil identificava-se com a história de Portugal e, especialmente, com as profecias de Bandarra. Pedro I assumia o carisma providencial de D. Sebastião, enquanto o Brasil tornava-se o sucessor legítimo de Portugal, como sede do Quinto Império, tal qual colocava a literatura profética e apocalíptica que perpassou toda a história portuguesa. Por conseguinte, para Antônio Barbosa, o verdadeiro Encoberto não era mais D. Sebastião, mas Pedro I. E a realização do Quinto Império, já preconizado por Antônio Vieira, assumia a forma do Império do Brasil: “Inda o tronco está por vir / Já nos vejo erguido a Cedro / Pouco vai de Pedro a Pedro / Se a rama do tronco medir”[2]. A ilha encoberta descrita nas trovas, que de lá chegaria o verdadeiro rei, não era Portugal; nem o rei era D. Sebastião, como sempre fora interpretado. A ilha era o “feliz Brasil”, escolhido pela divina providência para nele “arvorar o Poderosíssimo Monarca dos Monarcas do Mundo”[3]. Este rei era D. Pedro que, em breve, levaria seu domínio também a Portugal. A feliz época era o ano de 1826, ano em que, por acaso ou não, se deu a morte de D. João VI, trazendo todo o imbróglio da sucessão

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  1. Ibidem, p. 6-7, grifo do autor.
  2. Ibidem, p. 55.
  3. Ibidem, p. 65.