za dos velhos e legítimos portuguezes “feitiço” e “feiticismo”: são lusitanismos introduzidos na lingua franceza; todos os diccionarios o dizem. Digamos, portanto, em bom portuguez, “feitiço” e “feiticismo”.
A ideia da conferencia exige tambem explicação breve. Que é “feiticismo”, e que quero dizer, quando falo do “feiticismo dos poetas brasileiros?” No sentido preciso e rigoroso, feiticismo, ou o culto dos feitiços é a religião dos que veneram certos objectos naturaes ou artificiaes, ou um animal vivo ou morto, ou uma arvore, ou uma pedra, ou um idolo. O feiticismo é uma tendencia natural para o homem. Toda adoração tende a tornar-se feiticista. Quando se funda uma religião, os seus fundadores, querendo corporificar aos olhos dos crentes a divindade a adorar, tratam logo de symbolizal-a numa imagem, porque sabem que todo o homem, ainda o mais intelligente e culto, só comprehende bem, e só pode bem respeitar e amar aquillo que cae sob a acção directa dos seus sentidos. Assim, o idolo, a imagem é apenas a figuração corporea, a representação visivel e tangível do deus. Não é propriamente à imagem, ou á madeira, ao gesso, ao metal, ao pano, de que é feita a imagem, que se devem dirigir as preces e os preitos dos fieis, mas, sim, unicamente, ao deus immaterial, ao puro espirito que a imagem representa. E’ isso o que pretendem os fundadores das religiões. Mas, com o correr do tempo, o povo, que é entranhadamente e irremediavelmente feiticista, esquece a ideia do espirito que o idolo symboliza, e começa a adorar a propria imagem, como se ella, na sua passividade, na sua materialidade, fosse realmente um deus, dotado de acção,