Página:Ursula (1859).djvu/108

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e voz, e ele blasfemava, e ameaçava, e sorria-se com sarcasmo. Os olhos chispavam fogo, e os lábios agitavam-se convulsos e os membros e o tronco pareciam cobertos de sangue.

E ela revolvia-se no leito, e o corpo tremia-lhe e o suor corria-lhe, e o peito opresso ofegava: era um pesadelo insuportável!

A noite ia já alta, a moça entrou no quarto de sua mãe; ia talvez revelar-lhe o que se havia passado na mata, descrever-lhe as feições do desconhecido, o acento de sua voz, para ver se descobria indícios que a elucidassem sobre esse terrível adorador, ou ao menos procurar conforto no coração materno, quando com redobrada amargura esta disse-lhe:

— Ânimo! Minha querida filha, não chores: os meus sofrimentos vão já acabar. Sinto aproximar-me da sepultura! Mas Deus me há de permitir ainda ver-te feliz. Sim, feliz! Porque Tancredo te há de dar a ventura, que tanto hei pedido ao céu para a minha Úrsula.

A moça, então traspassada de dor, olhou para essa infeliz mulher a quem tão ternamente amava, estremeceu de angústia. Luísa B. não poderia já aspirar a muitos dias de vida, e essa lembrança fez-lhe esquecer sua desagradável apreensão, e até mesmo seu amor apaixonado para entregar-se toda à dor de uma eterna separação, que ela antevia como irrevogável.

E debruçada sobre o colo materno, a donzela derramava sentido e terno pranto que vinha lá do fundo da alma, onde havia dor mil vezes mais cruel que a própria morte.

Ela fechava aqueles olhos alquebrados, que mal podiam já acariciar os seus, aqueles lábios semimortos, que fracamente exprimiam a ternura maternal, aquelas mãos