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Susana não vinha atada à cauda de um cavalo, caminhava com a fronte erguida, e com a tranquilidade do quem não teme; porque é justo.

— Foge, Susana! – bradou-lhe da orla da estrada uma voz forte: ela pareceu nada ouvir, e o padre continuou:

— “Se subira ao céu, vós lá estais; se descera aos infernos ali vos encontraria”.

Então a voz tornou-se a ouvir, e um homem apareceu. Era o ex-feitor; o padre e os negros o reconheceram.

— Foge, Susana!

— Fugir? Não, meu senhor. Não sabeis que sou inocente?

— Louca! – tornou ele – Toma o meu cavalo e foge. Que importa àquela fera a tua inocência? Acaso não conheces o comendador?

Susana replicou-lhe com vivo reconhecimento:

— O céu vos pague tão generoso empenho; mas os que estão inocentes não fogem.

E o sacerdote prosseguia:

— “Se tomasse as asas da alva, e habitasse no cabo do mar, até ali vossa mão me guiaria e vossa destra me sustentaria”.

Susana levantou os olhos para o céu, e quando os abaixou, disse:

— Ide, meu filho! O céu vos abençoe.

O ex-feitor deu então as rédeas ao seu cavalo; deixou passar aquela vítima resignada de tão implacável cólera, e tocado pela sublime brandura daquela velha africana, lamentou profundamente a sorte mesquinha e horrível que lhe preparara o comendador, que em sua insânia parecia despenhar-se irremissivelmente nos abismos do inferno.