Uma Campanha Alegre/I/XXII
Agosto 1871.
O Sr. Barros e Cunha há dias tinha calor, e não se pôs em mangas de camisa! Via-se bem antes de ontem que o Sr. Arrobas estava apertado no seu colete, e no entanto não se desabotoou! Estranhas abstenções! Porque se coíbem, santo Deus? Porque se impõem a inexplicável privação de não beberem cerveja na sala? Que significa esta falsa compreensão das regalias constitucionais?
Porque não tiram, para maior comodidade de suas pessoas, a consequência lógica do seu procedimento? Se se desprenderam de todo o respeito, porque não se desembaraçam das suas gravatas? Se se atribuíram o direito de dizer injúrias, porque não se dão o direito de trazer chinelas? Porque conservam uma certa compostura de toilette - se têm desabotoado tanto a dignidade? Vamos, meus belos cavalheiros da injúria franca! Um último passo! Já aniquilaram o decoro, ponham de lado a polidez.
Nem mesmo se prendam com o asseio! Tirem os botins, e atirem por cima das carteiras, à face do País, essas peúgas de alvura duvidosa! Desapertem esses coletes, e que a
Pátria veja nas pregas das camisas o suor dos seus eleitos! Venha cerveja! Saltem as primeiras rolhas! Caiam as últimas injúrias! Ferva a intriga e espumem os bocks! Ao tilintar dos copos misture-se o embate dos insultos! - É falso, mente! Mais cerveja! Issoé uma bestialidade, fora! Cigarros! Rompam as disputas de café em atitudes de taberna! Ninguém se coíba! Que o fumo do tabaco faça uma nuvem às votações - e as nódoas de vinho um comentário aos projectos de lei! E praguejem, e assobiem, e escarrem! E viva a troça! Hip! hip! hip! Hurra! Salta um decilitro! Fora, patife! E lari-lo- lé, lo-lé! Para o pagode! Oh! legisladores! Oh! homens de Estado! Oh! feira das
Amoreiras!
Pois temos nós obrigação de respeitar a câmara, quando ela se não respeita? Pois ela vive nas assuadas indecorosas - e há-de exigir que nos curvemos como se ela vivesse nas ideias elevadas? Pois aquela senhora, que ali mora defronte, poderá estranhar que eu a repila brutalmente, em lugar de a saudar delicadamente - se em vez de passar na discreta compostura do pudor, ela me vier fazer esgares com a cuia à banda?
Porque vos havemos de respeitar, dizei? Pelo saber que não tendes? Pela dignidade que renegastes? Lêem-se os extractos de todas as câmaras do mundo, e em todas há seriedade e discussão inteligente; em todas se trabalha, se pensa, se organiza, se legisla. Entre nós vemos, durante um mês, arrastar-se uma discussão sobre perso-nalidades de regedores; e o que se debate é se se fez ou se não fez a estrada da Covilhã, e se o Governo comprou ou não comprou exemplares de um Elogio do Sr. Ávila! E todas as questões úteis e altas desprezadas, e uma perpétua ventania de insultos trocados, e o abandono de toda a ideia, o ódio de todo o trabalho, o esquecimento de toda a decência! E no entanto a Espanha mede, polegada por polegada, a porção da nossa liberdade que se vai enterrando no lodo!... Sois tão criminosos que nos fazeis perder o riso. E no entanto ele é a nossa vingança! E é indispensável que se mantenha sempre pronto, amargo, cruel, para que em nome da consciência ofendida vos vamos
A câmara dos deputados está tendo realmente uma compreensão muito estreita dos seus deveres parlamentares. Nota-se com espanto que os senhores deputados, ao entrar, não descalçam as suas botas! Ninguém explica esta reserva. expondo, querendo Deus, trémulos e grotescos, ao escárnio da multidão.