Uma Campanha Alegre/II/XII
XII
Janeiro 1872.
Alguns jornais acusam-nos, com toda a gravidade, de sermos violentamente hostis
à realeza e à família real: e obliquamente insinuam que estamos comprados pela demagogia para atacar a Coroa.
Outros jornais acusam-nos, com toda a severidade, de sermos benevolamente cortesãos com a realeza e a família real: e perfidamente sugerem que estamos comprados pela Coroa para vergastar a demagogia.
Fundam-se os primeiros em que fomos menos amoráveis com Sua Majestade a
Rainha — revelando a história indecorosa do mendigo preso.
Fundam-se os segundos em que fomos vassalamente aduladores com Sua
Majestade El-Rei — revelando que ele espalhava, no Bairro da Ajuda, seis contos de réis de esmolas.
As pessoas imparciais compreendem decerto o nosso embar aço:
Por um lado quereríamos desde já atirar palavras pungentes à Coroa, para eficazmente provar que não estamos comprados pelo seu oiro: — mas então patentemente se perceberia que o que nos inspira a prosa amarga, são as bolsas de dinheiro com que nos cobre a pálida demagogia.
Por outro lado quereríamos desde já devotar períodos amorosos à Coroa, para mostrar que não nos acorrenta a força dos tesouros demagógicos: — mas então abertamente se veria que, se falamos com um som tão meigo, é sob a influência dissolvente dos cofres da Coroa! Lívida colisão!
De tal sorte que resolvemos imprimir estas duas cartas, pedindo a rápida justificação da nossa integridade à Monarquia e à Revolução:
AO REI DE PORTUGAL
Senhor. — Alguns malévolos, nossos comuns inimigos, espalham subtilmente que
Vossa Majestade nos sacia de oiro, para que as Farpas conservem perante Vossa
Majestade uma atitude curvada e risonha. Rogamos a Vossa Majestade se digne declarar se já deixou cair na nossa mão estendida — o seu corruptor metal! Vossa Majestade, com mal disfarçado despeito o dizemos, nem sequer é assinante das Farpas! Procedimento este que prova não ser inteiramente erróneo o que a história conta dos crimes da realeza.
Aproveitamos a ocasião de lembrar a Vossa Majestade que são esses actos que tornam odiosos os tiranos — e que, mais tarde ou mais cedo, erguem o desagradável cadafalso de
Carlos I. Um rei que não assina as Farpas vai por um declive, ao fundo do qual tem de encontrar a chorosa vereda do exílio ou o gotejante corredor da masmorra. A recusa da assinatura merece a desforra da revolução! Cuidado! Em todo o caso, por hoje o que pedimos a Vossa Majestade é que declare, como é a intransigível verdade, que nunca
Vossa Majestade passou para a nossa mão uma parte dos seus valiosos tesouros. —
Humildes vassalos.
À HIDRA DA ANARQUIA
Tendo alguns jornais dado a entender que nós atacávamos a realeza porque estávamos para isso pagos pela Hidra da anarquia — pedimos ao dito bicho que declare, publicamente, a falsidade desta asserção imunda.
Aceite, Sr.a Hidra, os protestos da maior consideração. — Os redactores das
«Farpas».