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As Minas de Prata/I/XVIII

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Já tinham rezado completas no Colégio dos Jesuítas.

Os frades se retiraram aos seus cubículos; os vastos salões ficaram completamente desertos e às escuras; reinava em toda a casa profundo silêncio.

Os rumores da festa que ainda enchiam a cidade batiam contra os altos muros externos do claustro; mas nenhum eco do mundo penetrava já no templo do Senhor.

Decorreu uma boa meia-hora.

Cinco vultos negros, esgueirando-se pelo comprido corredor que separava os vastos dormitórios, entraram a um e um na sala da biblioteca, e depois de trocarem mesmo no escuro um toque simbólico, agruparam-se defronte da pesada porta de vinhático que dava entrada para o cartório. Era este o lugar reservado onde se guardavam os papéis de importância, a escrituração mercantil e o cofre da comunidade, cujos rendimentos cresciam anualmente, aumentados pelas doações régias e deixas particulares.

Os religiosos que esperavam à porta do cartório eram o P. Nunes, reitor; o P. Inácio do Louriçal, que vimos conversar à janela do convento, enquanto duraram as festas, com o jesuíta chegado naquela manhã; o P. Luís Figueira, autor da gramática da língua tupi, o qual em 1607 tinha escapado ao martírio entre os selvagens da Serra da Ibiapaba, na Capitania do Ceará; o P. Domingos Rodrigues, ardente missionário, que havia seis anos reduzira os ferozes Aimorés da capitania e o P. Manuel Soares, cronista e autor de importantes manuscritos, que infelizmente não chegaram aos pósteros para bem de sua fama.

Havia alguns instantes que os jesuítas esperavam sem trocar uma palavra, quando ouviu-se o roçar de sandálias, e ao frouxo clarão de uma lanterna surda apareceu o provincial Fernão Cardim acompanhado pelo P. Gusmão de Molina.

Os jesuítas não se admiraram de ver entre eles o novo irmão que sabiam ser professo; mas conhecendo a política da ordem, pressentiram que sua vinda ocultava algum negócio grave; o provincial, tirando a chave que trazia à cinta, abriu a porta, que fechou interiormente, enquanto um dos outros irmãos acendia a grande alâmpada de prata suspensa ao teto do aposento.

Figure-se um gabinete pouco espaçoso, entre quatro paredes guarnecidas por largos armários que subiam até a abóbada, alcatifado de alto a baixo com uma fazenda espessa que forrava também o soalho, tendo uma só porta, e fronteira a esta uma janela revestida de gradil de ferro; e se fará ideia exata desse aposento, no qual o som da voz ou dos passos por mais forte que fosse morria abafado e não transpirava.

Na larga banca de jacarandá de forma oval via-se o tinteiro, a poeira e a campainha, tudo de prata de lei e de proporções desmesuradas. À cabeceira, que ficava do lado da janela, estava a seda ou cadeira presidencial que ocupava de ordinário o superior da comunidade, quando não se achava presente o provincial; aos lados haviam assentos rasos destinados aos simples conselheiros.

Era nesse lugar que os principais da Companhia de Jesus, incumbidos do governo da Província do Brasil, faziam as suas conferências secretas, nas quais só eram admitidos os irmãos do quarto voto, geralmente chamados os professos; únicos de toda a numerosa associação, que tinham conhecimento das altas questões políticas que interessavam a Ordem.

Os outros membros, coadjutores, estudantes e noviços, condenados pelo instituto do fundador à oboedientia coeca, nem sequer penetravam naquele santuário, onde muitas vezes decidiam da sua sorte; máquinas animadas, autômatos vivos, moviam-se conforme a impulsão que lhes dava a inteligência superior que os dominava: Perinde ac cadaver.

Quando a mesa achou-se ocupada pelos jesuítas, o provincial voltou-se para o novo irmão:

— O capítulo está reunido: V. Paternidade pode falar.

Por toda resposta o P. Molina inclinou-se e apresentando a Fernão Cardim um pergaminho dobrado, que tirou da manga, disse-lhe com a habitual humildade:

— Faça a mercê de ler, padre provincial.

O superior ergueu-se com uma ligeira comoção, que logo dominou; beijou a mutra, e fez a leitura, que foi ouvida em respeitoso silêncio pelos jesuítas.

Era um breve do Geral assim concebido:


                                                 AD MAJOREM DEI GLORIAM

Nós, Cláudio Aquaviva, pela autoridade da Santa Sé Apostólica e voto da Congregação, Superior Geral da Companhia de Jesus, nomeamos o Reverendo P. Gusmão de Molina Visitador e Assistente na Província do Brasil, e mandamos a todos os nossos irmãos, assim religiosos como seculares, por tal o reconheçam e lhe prestem obediência plena.

Em nome do Padre, do Filho, e do Espírito Santo, amém.

Dado em Roma na Casa da Companhia, aos 5 de agosto de 1608.

Cláudio Aquaviva


Ao lado esquerdo do pergaminho via-se o selo chão em lacre preto com a mutra do anel que usava o Geral; logo abaixo a nota do registro feito na secretaria da Ordem.

Quando o provincial, terminada a leitura, pronunciou pela segunda vez o nome do homem que a mil léguas de distância fazia estremecer todos esses velhos encanecidos e provados nas vicissitudes da vida, os olhares dos jesuítas cruzando-se caíram sobre o rosto do P. Gusmão de Molina, como para lhe arrancarem da fisionomia o motivo da nomeação secreta e do poder imenso de que se achava revestido.

O assistente ou visitador era um dos mais altos cargos da Companhia; só tinha superior em hierarquia o Geral, de quem era delegado e representante. Dentro da nação ou da província a que era enviado, governava como soberano até o momento em que o poder supremo, que o tinha elevado, o quebrasse de repente como um torrão de argila.

Depois do P. Inácio de Azevedo, morto em 1569 às mãos dos corsários huguenotes, que capturaram a frota, em que vinha ele com sessenta religiosos e o Governador D. Luís de Vasconcelos, nomeado para suceder a Mem de Sá, nenhum outro assistente fora mandado ao Brasil. Quarenta anos durante o Geral deixara a direção dessa província entregue ao prelado ordinário.

Era natural pois que os padres ficassem surpresos; essa nomeação secreta, que não lhes fora comunicada, nem de Portugal, nem da Espanha, indicava um acontecimento de grande alcance, ou uma reforma no governo da província; qualquer desses dois pontos interessava altamente os professos da Bahia, para que eles se apressassem em conhecer as intenções com que vinha o P. Molina.

Mas a fisionomia deste não respondeu aos olhares interrogadores.

Calmo e frio, o assistente acompanhara a leitura do breve; seu rosto não tinha expressão, ou se a tinha, era indefinível; não se podia distinguir, que sentimento dominava naquele semblante imóbil, se a indiferença e a bonomia, ou a severidade gélida e impassível. Os olhos em vez de projetar os raios visuais, pareciam voltá-los interiormente, deixando a pupila baça e pasma como um vidro a que o vapor houvesse empanado o cristal.

Sem dar mostras de aperceber-se da investigação profunda que as vistas perscrutadoras dos jesuítas faziam sobre sua fisionomia, o P. Molina dirigiu-se ao provincial, que partilhava a desconfiança geral e conservava ainda nas mãos o pergaminho que acabara de ler.

— Queira V. Paternidade passar aos nossos irmãos.

Fernão Cardim entregou o breve ao reitor, o qual o deu ao P. Inácio; assim passou de mão em mão até o último. Este, depois de examinar minuciosamente a letra e o selo, como tinham feito os outros, apresentou-o ao assistente, que o recusou com um gesto.

— Julgam que esteja conforme? perguntou ele.

Os seis jesuítas inclinaram-se em sinal de assentimento.

— Registem-no então.

O P. Molina esperou que o reitor copiasse no livro próprio a carta de sua nomeação, terminado o que, dobrou-a de novo e guardou no peito da roupeta; arrastando a cadeira de espaldar colocada à cabeceira da mesa, sentou-se acenando aos outros que o imitassem.

Um instante volveu o olhar pasmo e sem brilho pelos seis frades recolhidos na aparência, mas interiormente suspensos de seus lábios e ansiosos pela palavra que devia esclarecer o enigma; por fim apoiou os braços à borda da mesa, e deixou cair as frases a uma e uma como se as tivera composto e decorado com antecedência.

— Não preciso dizer-vos eu, pois o adivinhais, que me trouxe ao Brasil missão importante. Trata-se de objeto que interessa mais que muito à Companhia. Sabeis que El-Rei de França permitiu tacitamente há cinco anos que de novo entrássemos em seus estados; tal concessão foi-nos de grande valia, porém muito nos resta ainda por alcançar. Enquanto o Edito de Nantes não for revogado, seremos tolerados, mas não admitidos; a Companhia não poderá criar naquele país uma influência bem sólida. Quanto é isso necessário, bem o conheceis: mas por que meio o obteremos?...

O jesuíta parou deixando a pergunta suspensa; e como não tivesse resposta continuou:

— Um meio há, e pronto, e infalível. O dinheiro, que tudo vence, fará em uma hora maior conversão, do que têm feito tantos anos de apostolado. As guerras atrasaram as finanças da França e o protestantismo de El-Rei Henrique IV não será tão intolerante, que repila algum forte subsídio, unicamente porque lhe é oferecido por mão católica. A Companhia precisa pois de soma avultada, que não lhe pode ser fornecida senão pelas nossas províncias de Ásia e América. Eis a que mandou-me a vontade soberana a quem devemos obediência: espero me ajudareis com o vosso avisado parecer.

Concluindo sua exposição oratória, o P. Molina bem percebeu que nenhum dos seus ouvintes tinha acreditado uma palavra só do que ele acabava de dizer.

Com efeito os padres, sabidos e ousados na arte da dissimulação em que primavam os jesuítas, conhecedores de todas as sutilezas e disfarces que tinham costume empregar nas altas negociações, compreenderam que o P. Molina havia realizado o preceito dos mestres da Ordem, os quais ensinavam que — “a palavra era o melhor meio de ocultar o pensamento”.

Essa fábula do Edito de Nantes, quando por muitos outros motivos não parecesse inverossímil aos membros do capítulo, tinha contra si uma razão de grande peso; era que, se fosse verdadeira, o assistente não a confiaria tão facilmente e sem necessidade a homens cuja discrição não conhecia, e que podiam contrariá-lo nesse plano de exaurir o tesouro da província em benefício de Roma e dos estrangeiros.

Todos eles ficaram portanto firmemente convencidos que o P. Molina tinha preparado aquela história para iludir a sua curiosidade, com o fim de poder depois livremente tratar do verdadeiro objeto da missão e obter deles os esclarecimentos e informações de que necessitava. Mas escarneceram interiormente daquele ardil tão comum e vulgar, que depunha contra a perspicácia do assistente; e redobraram de atenção para apanhar no meio da discussão a menor palavra, o mais simples gesto que denunciasse o segredo.

Ao P. Gusmão, porém, não escapara a suspeita dos seis conselheiros.

— Que pensa a respeito o P. Provincial? Será possível obtermos alguma parte da soma precisa?

— A falar verdade, devo confessar a V. Reverência que não julgo a coisa fácil. A terra é rica, porém os haveres vão-se mais em luxo e prazeres da carne, do que em esmolas e deixas pias. Quanto aos bens da Companhia, são poucos por ora, e seu rendimento apenas arrecadado é logo remetido a Portugal. Contudo não esmoreço; e como é em serviço da religião, dela tiraremos forças para levar a cabo tamanha empresa.

— E o P. Reitor, que aviso nos dá? perguntou o assistente, mostrando-se contrariado.

— Meu voto é de bem pouca monta; mas ajudando Deus, creio que poderei auxiliar V. Paternidade no cumprimento de sua tarefa.

— Vejamos o como.

— Vive nesta cidade uma dama espanhola ainda moça, a quem parece que um grande infortúnio desgostou do mundo.

— Diz que parece, P. Reitor? perguntou o assistente com um sorriso inexprimível.

— V. Reverência admira-se?... Também eu; porém por maiores esforços que tenha feito, ainda não consegui dela ouvi-la de confissão. Deve de ser um caso grave para que resista a todas as admoestações, e mesmo ao terror da condenação eterna!

— E em que nos pode servir essa mulher?

— É possuidora de imensa riqueza, que de seu pai herdou, e não está longe de, mesmo em vida, fazer doação dela à Companhia.

— Bem, veremos a sua penitente, padre reitor. Em quanto lhe avalia os teres?

— Ela própria não lhes sabe o valor. Deixou-os seu pai num cofre enterrado em certo lugar; a filha com o seu desapego às coisas mundanas nem sequer teve ainda a curiosidade de o ver.

— Pensa então que esse tesouro esteja no mesmo lugar? disse o P. Molina com seu fino sorriso.

— Não há razão para que duvide: ninguém mais afora ela sabe do segredo.

— Quem enterrou o ouro?

— O pai só e durante a noite, pouco tempo antes de finar-se.

— E essa dama chama-se?

— Tem nome pouco vulgar, que me parece suposto. Chama-se D. Marina de Peña.

Uma plica imperceptível traçou rapidamente a vasta fronte do assistente; mas desfez-se logo, e fora impossível distingui-la da sombra tênue e móbil que projetavam em seu rosto os trêmulos clarões da alâmpada, coando entre os cabelos revoltos.

— Ainda assim, não lhe tenho o segredo por muito seguro. Devem de haver serviçais na casa.

— Há uma aia que tomou logo que chegou da Espanha, e mais um escravo. Esses, se alguma coisa soubessem, já se teriam aproveitado, e não ficariam decerto ao seu serviço.

— Contudo! O ouro é como a luz de que tem a cor e o brilho; ainda no seio da terra surde.

— O que for se há de conhecer, disse o reitor um tanto despeitado.

— Certo! Nestes casos as suposições nada valem. Trabalhemos na esperança do sucesso; e a seu tempo a verdade aparecerá. Entretanto já temos por onde começar, e o nosso irmão P. Inácio, naturalmente vai propor-nos algum outro alvitre.

— Se o tivesse, não esperaria que mo pedisse, padre assistente; porém curo mais dos bens d'alma, do que dos bens terrestres.

— V. Paternidade procede sabiamente, disse o P. Molina amaciando a voz; somente digo que se todos assim procedessem, a Companhia não teria forças para vencer tantos inimigos, que a perseguem, nem meios de empregar-se no serviço da religião. Uma coisa não exclui outra, P. Inácio; curemos d'alma, arrostemos o martírio se necessário for, para plantar a fé entre os selvagens; mas não esqueçamos que é preciso combater o mundo com suas próprias armas. Esta roupeta que nos veste, não é nem de melhor fazenda, nem de mais custo, do que o hábito de qualquer outra ordem; mas ela representa a milícia do Cristo e o poder imenso da Companhia; por isso abre todas as portas, e vê em todas as consciências. Dispa-a, e suas palavras, embora ungidas pelo Senhor, cairão em terra sáfara.

O P. Inácio abaixou a cabeça e não respondeu.

— Também pensa do mesmo modo o P. Figueira? perguntou o assistente a outro jesuíta.

— Penso que V. Reverendíssima tem razão; e pesa-me que, sobrando a vontade, falte-me a força de servir à Companhia em objeto de tamanho alcance; mas se uma esperança pode ser de alguma utilidade...

— Uma esperança é já alguma coisa; quando a cultiva mão tão hábil, é flor que sempre vinga e dá seu fruto.

O padre corou modestamente com o elogio do superior: encolheu-se na capa, como um homem que não se pode eximir de certo acanhamento e timidez falando a pessoas autorizadas.

— Tomou-me há tempos por seu confessor, disse ele, a Senhora D. Luísa de Paiva, viúva já idosa e muito conhecida nesta cidade pelo seu avultado cabedal. Faleceu-lhe o marido há seis anos deixando uma filha única, que está hoje moça. É senhora de muita virtude; mas tem ainda restos de sangue impuro...

— Ah! é de raça judaica! exclamou o P. Molina.

— Infelizmente assim é, respondeu o P. Figueira.

— Devem ter passado ao Brasil muitos desses cristãos-novos, depois de levantada a proibição? replicou o assistente pregando os olhos no teto.

— De feito não é pequeno o número dos que têm vindo.

— Para isso compraram tão caro o direito a El-Rei, que não soube o que vendia.

Os jesuítas tinham levantado a orelha, apenas o P. Molina fizera o primeiro movimento de surpresa, e acompanharam o curto diálogo com atenção disfarçada. Pareceu-lhes ter entrevisto o fim secreto da missão do assistente.

Em 1601, os pobres judeus, a quem era proibido pela lei de 30 de junho de 1567 passar às colônias, ofereceram a soma de 200.000 cruzados pela revogação do interdito; semelhante transação que bem revelava os lucros avultados que essa raça industriosa e mercantil tirava do comércio da Índia e do Brasil, ofendia os interesses da Companhia. Desde então não cessara ela de insistir pela revogação da lei de 30 de julho de 1601.

Nada mais natural portanto do que tratar agora a poderosa associação de afastar os competidores que lhe disputavam boa parte das riquezas do Novo Mundo. Para tamanha empresa fora mister um homem hábil que excitasse nas populações o espírito de intolerância religiosa, bem intenso ainda no século XVII, coagindo assim El-Rei a voltar à antiga proibição de passarem judeus às colônias.

E esse homem não seria o visitador?

Simultaneamente luziu a centelha no espírito dos cinco jesuítas. O sorriso sutil que mal rugou os lábios mostrava a satisfação íntima da inteligência que alcançara resolver um problema difícil.

Entretanto o P. Molina, a quem não escapara o efeito produzido pela sua pergunta, reatava o fio à narração interrompida.

— Mas isso não nos interessa agora. Dizia V. Paternidade?...

— Que D. Luísa de Paiva é descendente de uma família de judeus; e pois, embora sua fé seja robustíssima, remorde-lhe aquela mácula. Estou que seu zelo bem aconselhado não duvidará remir a culpa, fazendo esmola de todos seus cabedais a uma casa de oração que possa bem empregá-los no esplendor do culto divino.

— Se não me engano, ouvi que tinha uma filha?

— Não se engana V. Reverência, não, respondeu o P. Figueira sorrindo; tem uma filha; porém essa menina, se já não sente, é natural que venha a sentir breve, irresistível vocação para o claustro; e então...

— Compreendo! A mãe poderá dispor livremente de seus haveres.

— E satisfazer as pias intenções da sua alma devota.

— Nenhum destes auxílios é para desprezar-se, replicou o P. Molina; mas não são de pronto resultado; e para o fim que é de pouco servem. Cumpre recorrer a meios mais rápidos e...

— Se V. Reverência permite?... atalhou um frade gordo que ainda não tinha proferido palavra.

— Pode falar o P. Manuel Soares. Estamos aqui para ouvir, disse o assistente.

— Talvez pareça ousadia querer eu decidir ponto em que nossos irmãos se acharam embaraçados; mas cada um deve ocupar-se do que lhe é ordenado; e aquele não merece mais, que só cumpre o seu dever.

— Então, V. Paternidade julga ter descoberto o meio de dar à Companhia a soma de que ela precisa?

— Julgo que poderei dar à Companhia, não três milhões, porém cinquenta, respondeu o P. Soares.

— Como? perguntou o assistente com vivacidade.

— V. Reverência conhece a história das minas de prata de Robério Dias?

— Ah!...

Esta exclamação indefinível e o riso de ironia que esclareceu o rosto pálido e severo do assistente, não produziram a menor impressão no P. Soares; calmo e plácido, como quem sustenta convicção profunda e inabalável, o frade contentou-se com encolher os ombros.

— Quer V. Reverência prestar-me atenção?

— Sem dúvida; V. Paternidade diga, que o escutamos.