Castelo Perigoso/II
Porque a confissão aproveite à saúde da alma, deve a haver seis condições. A primeira, que seja feita sagemente. E esta sageza é em duas coisas. A primeira que o homem resguarde a quem se deve a confessar. A segunda, de que se deve a confessar.
Diz Santo Agostinho que o que homem faria por esquivar a morte corporal, deve fazer por quitar a morte da alma. E nós vemos que os doentes, por sua saúde, buscam com boa vontade os melhores e mais sages físicos que podem. E assim diz ele que quem se quer sagemente confessar e achar graça ante Deus, ele deve a buscar tal confessor que seja entendido para ligar e desligar.
Isto quer dizer: que saiba bem conhecer o pecado e aconselhar o pecador, e que haja poder de absolver e de dar a pendência segundo o pecado. Mas convém que aqueles que vivem em obediência de religião se tenham a tal confessor como lhe for dado.
Mas bem resguardem os maiores que confessores dão; que, se alguma alma perecesse por ignorância do confessor, Deus demandaria a eles e aos confessores mesmos, que não devem de filhar tal cargo, se se não sentem bastantes de dar conselho a quem o há mister.
Além disto, quem sagemente se quer confessar, com viva diligência deve pensar em seus pecados, desde aquela hora que se soube conhecer, se outra vez não foi confessado, de verdadeiro coração, sem fingir, e fez a penitência a seu poder até aquela hora e, todo seu coração e sua consciência buscar como e por quantas maneiras anojou Deus e a sua bendita Madre e todos os santos por todo o curso de sua vida.
Porque em a mancebia fazem os homens muito espantosos pecados, de que não têm honta; e por vergonha de confessar, achamos em livros muitas gentes, especialmente mulheres condenadas e perdidas.
Hee! má criatura, digna de perdurável fogo, qualquer que tu és, que hás vergonha de teu pecado e não hás empacho de pecar sujamente ante Deus, que a olhos abertos te vê, e não és ousado de o dizer a um homem pecador. Não vale nada tal fugir, que quem seu pecado não confessar, se há tempo e espaço, nunca haverá Deus nem o paraíso, por muitos que faça de bens, de que lemos dois exemplos muito espantosos que aqui são escritos por edificação.