Compendio de Botanica/X
CAPITULO X.
Da Nutrição e mais funcções das plantas.
SECÇÃO I.
Absorpção e Sucção.
Até aqui temos estudado todos os orgãos da vegetação, isto he, aquelles que servem ao desenvolvimento e formação do vegetal; passamos agora a vêr como se faz a nutrição, e a parte que toma cada hum delles em particular, e quaes são as condições necessarias para que possa ter lugar.
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A nutrição he huma funcção, pela qual os vegetaes assimilão huma parte das substancias solidas, liquidas ou gazosas espalhadas no seio da terra, ou no meio da atmosphera, e que elles absorvem, ou pela extremidade mais delicada das suas radiculas, ou por meio das partes verdes, que se desenvolvem na atmosphera.
He em virtude de huma força particular de sucção, de que são dotadas estas diversas partes, que se effectua a absorpção destas materias, e a sua introducção no tecido vegetal.
Ja dissemos, que he pela extremidade das fibrillas mais delicadas, que as raizes absorvem do interior da terra os fluidos, e os gazes que nella existem. Todas as partes verdes do vegetal, taes como as folhas e os ramos novos, são igualmente dotadas de huma força de sucção muito consideravel, e concorrem tambem a esta funcção muito importante.
As radiculas capillares penetradas no seio da terra, absorvem pelos seus esponjiolos a humidade de que se acha impregnada. A agua he o vehiculo necessario das substancias nutritivas do vegetal: porêm não he ella a que fórma a base da sua alimentação, como julgavão os antigos physicos, mas serve tão somente de menstruo aos corpos, que deve assimilar. Se quizermos fazer vegetar huma planta em agua distillada, e ao abrigo de todas as influencias extranhas, ella pouco durará.
Concluimos em fim, que a agua unicamente não serve á nutrição, ainda que concorra em parte, quando he decomposta e reduzida aos seus elementos.
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ARTIGO 1.º
Formação do carbonio, oxygenio, azoto, nos vegetaes.
O carbonio não pode existir no estado de pureza e isolação, pois que he muito raro na natureza, e não he soluvel na agua. Porém todos sabem a affinidade que tem para o oxygenio, e que o acido carbonico, que se forma pela sua combinação, he muito abundante na natureza; e que a agua contêm sempre este acido em virtude da sua solubilidade. He pois no estado de acido, que o carbonio he conduzido aos vegetaes. Dissemos precedentemente, que as plantas expostas á acção dos raios do sol decompunhão o acido carbonico, conservando o carbonio, e regeitando a maior parte do oxygenio. A agua não serve senão de vehiculo a esta substancia alimentar da vegetação.
O oxygenio faz igualmente parte da substancia dos vegetaes. Segundo as experiencias de Theodore de Saussure, as plantas não regeitão todo o oxygenio, que acidifica o carbonio, conservão huma certa quantidade. O ar atmospherico, que circula nos vegetaes, tambem lhe cede huma porção de oxygenio, que entra na sua composição: porêm a maior parte do oxygenio e hydrogenio que contêm as plantas, he devida á decomposição da agua no seu tecido, decomposição, de que as leis ordinarias da chimica não nos dão huma explicação satisfatoria.
O azoto, que se encontra em certas substancias vegetaes, tira evidentemente a sua origem da decomposição do ar atmospherico no interior da planta.
Taes são as substancias inorganicas que entrão na composição do tecido vegetal. Porêm alêm destas, existem outras, que sem fazerem parte necessaria da sua composição, achão-se comtudo em quantidade mais ou menos consideravel; taes são: a cal, silicia, carbonato, phosphato, e malato de cal, carbonatos de soda e potassa, nitratos de potassa e ferro, etc.
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Segundo as experiencias de Theodore de Saussure, estas substancias chegão todas formadas ao interior do vegetal, depositadas no seio da terra ou da atmosphera, são dissolvidas ou conduzidas pela agua, que as transporta ao interior do tecido vegetal, não sendo preparadas pelo acto da vegetação, como dizem Schrader, Braconnot, e alguns outros botanicos e physicos.
ARTIGO 2.º
Causas da sucção.
As leis de physica e mechanica não podem explicar a potencia, que determina a sucção das raizes, e só admittindo huma energia vital inherente ao proprio tecido dos vegetaes, cuja natureza nos he desconhecida, determinando pela sua influencia os phenomenos sensiveis da vegetação. A força de sucção prodigiosa, de que são dotadas as raizes e os ramos, tem sido provada pelas experiencias de Hales, verificadas ultimamente por Mirbel.
Em muitas plantas, como nos cactus com particularidade, cujas raizes são tão pequenas, e que vegetão ordinariamente sobre os rochedos, ou nas areas movediças dos desertos, a absorpção dos fluidos nutrientes não pode ter lugar, senão pelas folhas quasi exclusivamente, e pelas outras partes mergulhadas na atmosphera; por isso que a pequenez das suas raizes, e a extrema aridez do terreno em que crescem, não bastaria para as fazer vigorar.
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Do que acabamos de dizer se conclue, que a superficie absorvente dos vegetaes he incomparavelmente mais consideravel, do que a dos animaes.
SECÇÃO II.
Da Seiva, sua marcha ascendente, e descendente.
ARTIGO 1.º
Natureza da seiva ascendente.
A seiva he hum liquido sem cor, e essencialmente aquoso, que as raizes absorvem do centro da terra, e as folhas extrahem da atmosphera, para servir á nutrição do vegetal. Contêm em dissolução ou suspensão os verdadeiros principios nutrientes, que deposita no interior da planta, á medida que atravessa o seu tecido. A natureza, não obstante ser essencialmente a mesma na maior parte dos vegetaes, apresenta comtudo differenças em muitas especies: em algumas acha-se a albumina ou materia analoga ao gluten: em outros porêm se acha huma grande quantidade de assucar, como no acer saccharinum, que contêm até cinco por cento do seu pezo. Varía tambem segundo as diversas partes das plantas onde se observa, e he tanto mais densa e saborosa, quanto se observa em huma altura mais consideravel do tronco. Contêm algumas vezes acido carbonico, oxalico, livres ou combinados com a cal e potassa.
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ARTIGO 2.º
Marcha da seiva ascendente.
A marcha da seiva se faz atravez das camadas lenhosas, e he a parte mais visinha do tecido cellular, que parece ser a séde principal da ascensão da seiva no caule das plantas. Segundo as experiencias de Magnole e Coulon, a seiva sobe pelas camadas lenhosas, que a communicão com as partes e ramos lateraes do tronco, directa ou successivamente, pelos poros intermolleculares, de que são fornecidos os orgãos que a conduzem.
ARTIGO 3.º
Rapidez do movimento da seiva.
Muitos experimentadores, particularmente Hales e Bonet, tem demonstrado que a força do movimento da seiva, em hum caule ainda mesmo do mais pequeno diametro, tem mais poderosa a sua acção sobre o mercurio, do que huma columna de ar igual á altura da atmosphera: assim mergulhando pés novos de feijão em fluidos córados, elles observárão que estes ultimos se elevavão; humas vezes meia pollegada em meia hora; outras vezes tres em huma hora; ultimamente quatro em tres horas.
Dutrochet e Corti fizerão hum grande numero de experiencias; para demonstrar o tempo, que certas plantas gastavão para voltarem a este estado, que se chama turgido, quando ellas o tem perdido pela evaporação.
Devemos a Bonaventura Corti as primeiras experiencias directas sobre o movimento dos fluidos no interior do tecido dos vegetaes: estas experiencias forão publicadas em hum opusculo, que tem por titulo Lettera sulla circolazione del fluido scoperta in varie piante. Modena, 1775.
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He principalmente na chara e caulinia fragilis, que elle fez as suas observações, donde tirou as consequencias seguintes: 1.º cada cellula da planta offerece hum movimento particular do succo: 2.º a circulação em huma cellula he independente, da que tem lugar nas outras cellulas: 3.º a corrente do fluido se dirige continuamente ao longo da face interna das paredes cellulares: 4.º a direcção da corrente he invariavel: 5.º o curso dos succos tem lugar em todas as cellulas com a mesma ordem.
Em 1807 Treviranus, ignorando os trabalhos de Corti, por meio de experiencias chegou a adquirir resultados inteiramente similhantes.
Schultz, e Amici se entregárão a novas indagações sobre o mesmo objecto. Segundo elles cada cavidade do tecido cellular constitue hum orgão distincto, e he no seu interior que o fluido se move, independentemente da circulação particular, que tem lugar em cada huma das cavidades adjacentes.
He principalmente na chara vulgaris e flexilis, e na caulina fragilis, plantas aquaticas, cuja organização mais facilmente se conhece, por causa da transparencia das suas partes elementares, que o professor de Modena fez as suas observações.
Huma cousa bem notavel he, que o movimento de cada vaso não parece ter relação alguma com o que se executa nos tubos circumvisinhos: assim por ex. algumas vezes, dous vasos que se tocão, offerecem o mesmo movimento, entretanto que os que cercão terão hum movimento opposto.
Amici igualmente notou, que de huma cavidade para outra não se vê passar globo algum movel. Comtudo elle não pretende estabelecer, que hum succo contido em hum vaso não penetre nos vasos visinhos, quando as circunstancias o exigem. Está até persuadido, que esta transfusão he necessaria para o desenvolvimento da planta; porêm a parte mais subtil do succo he a unica, que pode penetrar invisivelmente atravez da membrana, pelos buracos que nem mesmo a vista armada poderá descobrir. Novas experiencias feitas por Schultz de Berlim tem vindo esclarecer este importante objecto. Em 1820 elle annunciou, que nas folhas do chelidonium majus se podia perceber o movimento progressivo, que executa a seiva nos vasos que a contêm. Este movimento nota-se igualmente na maior parte dos vegetaes, em que o fluido nutritivo he córado, porque esta córação he devida aos globulos opacos e córados, que nadão em abundancia neste liquido aquoso.
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Depois desta epocha o author multiplicou as suas experiencias, e generalizou os seus resultados, ao menos nos vegetaes dicotyledoneos. Se tirarmos, por ex. a epiderme de hum fragmento de huma folha nova, ou de huma figueira, e particularmente do ficus elastica, e nella descobrirmos os vasos, que pelas suas ramificações e anastomoses compõem a rede que sustenta o tecido cellular, e se depois examinarmos esta parte por meio do microscopio, veremos circular o fluido com huma rapidez maior ou menor, segundo o estado de vitalidade da atmosphera, nos vasos seivosos, que fórmão em geral fasciculos delgados ao lado das tracheas. Este movimento conhece-se pelos globulos, que marchão ao mesmo tempo, que o fluido que os contêm.
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ARTIGO 4.º
Causas da ascensão da seiva.
Saussure attribue o movimento da ascensão da seiva á irritabilidade da membrana, que fórma os tubos em que ella circula.
Amici faz depender a ascensão da seiva da força motriz nas especies de pequenos grãos verdes ou transparentes, que fórmão as paredes dos tubos, onde são dispostos em series, e que por huma acção analoga á da pilha voltaica, imprimem o movimento ao fluido.
Grew reconheceu a causa no jogo dos utriculos. Este author, que considera o tecido do vegetal formado de pequenos utriculos juxtapostos huns aos outros e communicando todos entre si, pensa que a seiva logo que entra nos utriculos inferiores, estes se contrahem sobre si mesmos, impellindo-a para os que estão mais visinhos, e que por este mechanismo a seiva chega ao apice do vegetal.
Malpighi attribue a marcha da seiva á rarefacção e condensação alternativa da seiva pelo calor.
Outros em fim comparão a marcha da seiva no tecido vegetal á ascensão dos liquidos nos tubos capillares. Facilmente se conhece como estas hypotheses são insufficientes para explicar os phenomenos em questão.
Ainda que esta força vital seja o verdadeiro agente da ascensão da seiva, comtudo certas causas internas e externas podem facilitar o exercicio deste phenomeno.
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ARTIGO 5.º
Causas externas e internas auxiliadoras do movimento da seiva.
Entre as causas externas que podem auxiliar a força vital, como o verdadeiro agente da ascensão da seiva, devemos considerar a temperatura, a influencia da luz, e a do fluido electrico: porque sabemos que a temperatura quente favorece singularmente o curso da seiva, assim como he provado, que quando a atmosphera se acha constantemente carregada de electricidade, os vegetaes adquirem hum desenvolvimento consideravel, o que annuncia claramente que tem então hum curso mais rapido e poderoso. Entre as causas internas inherentes á estructura do vegetal, se deve contar a maior ou menor quantidade de poros corticaes que apresenta a planta, e a extensão mais ou menos consideravel da sua superficie. Estas duas circunstancias favorecem evidentemente a rapidez e a força da marcha da seiva.
Dutrochet occupou-se igualmente deste importante objecto. O acaso lhe fez descobrir huma propriedade bem notavel, de que gozão as membranas organizadas vegetaes e animaes. Observando com o microscopio as capsulas de huma pequena quantidade de bolor mergulhado em agua, vio pelo apice perforado sahirem pequenos globos, que erão evidentemente os esporulos: porêm ao mesmo tempo que estes esporulos sahião pelo apice, a agua em que mergulhava a capsula, penetrava atravez das suas paredes e enchia a parte inferior. Esta introducção da agua atravez da membrana se fazia com bastante força, para que depois da expulsão total dos globulos, se percebesse ainda huma especie da corrente pequena de agua sahir do interior, sem que comtudo ella se vazasse.
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Repetindo grande numero de vezes esta experiencia teve constantemente o mesmo resultado, quer empregasse membranas vegetaes e animaes, quer as vagens vesiculosas da colutea.
A introducção da agua atravez da membrana não se opera, em quanto esta não contêm hum liquido mais denso do que a agua, porque cessa logo que este liquido he expellido para fóra da cavidade pela agua. Este phenomeno he o resultado de huma força particular, de huma acção physica organica, a que Dutrochet dá o nome de endosmose.
Todas as vezes que dous liquidos de densidades differentes são separados por huma membrana organizada, estabelece-se entre elles huma corrente, que faz com que o menos denso attrahido por aquelle que he mais denso, tenda atravessar a membrana dirigindo-se para elle.
Na continuação das suas experiencias, Dutrochet observou outro phenomeno que completa as suas primeiras observações. Observou mergulhando o intestino cego de hum frango, ou outra qualquer cavidade organica cheia de agua, em hum liquido mais denso, a agua contida na membrana attrahida pelo liquido mais denso atravessava as paredes da membrana, para se reunir ao liquido cuja densidade he maior.
Este phenomeno he o mesmo que o precedente, porêm exerce-se somente em diverso sentido; he sempre a passagem de hum liquido menos denso atravez de hum mais denso. O author dá o nome de exosmose á força que preside a este phenomeno. Esta acção da mesma maneira que a endosmose, parece ser o resultado da electricidade, e he analoga áquella que obteve, pelo emprego directo da electricidade galvanica, o author Porret.
Este physico, diz Dutrochet, tendo separado hum vaso em duas partes por hum diaphragma de bexiga, encheu de agua huma de suas partes, e na outra lhe introduzio huma pequenissima quantidade da mesma agua. Tendo situado o polo positivo da pilha na parte cheia de agua, e o polo negativo na outra, observou que a agua atravessou as paredes da bexiga para a parte vasia, e se elevou a hum nivel superior áquelle, a que foi reduzida na parte primitivamente cheia.
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O author fez applicação dos principios, que descobrio nas suas experiencias, á statica dos fluidos nos vegetaes. Segundo elle a ascensão da seiva he o resultado da endosmose: he ella que produz a progressão da seiva por impulsão, e sua progressão por affluxão.
Vamos expor o mechanismo destes dous movimentos. Os espongiolos das raizes são os orgãos, em que a seiva ascendente recebe a impulsão, que a dirige para a parte superior do vegetal. Estes orgãos, sendo a séde exclusiva da absorpção da agua, se tornão turgidos pela endosmose. Os espongiolos, rodeados de hum meio humido, absorvem a agua, e a introduzem continuamente no interior das cellulas, que compõem especialmente o seu tecido. Esta agua introduzida por endosmose, e accumulada excessivamente nos orgãos que torna turgidos, recebe hum movimento ascendente que a impelle nos tubos ascendentes da raiz e do tronco.
Tal he a causa desta pressão consideravel, á qual está sujeita a seiva ascendente da videira e de alguns outros vegetaes, pressão superior á da atmosphera, assim como o provão as experiencias de Hales, repetidas por Mirbel e Chevreul.
Passamos agora á progressão da seiva por affluxão. Supponhamos hum tronco cortado, e mergulhado n'agua pela sua parte inferior; as cellulas e os vasos situados na superficie das suas folhas perdendo, pela evaporação, huma parte dos fluidos que contêm, a endosmose continuamente activa tende sempre a preencher o vacuo, pela introducção dos fluidos dos orgãos visinhos; esta acção, que opera a affluxão da seiva para as folhas, se extende successivamente até á base do tronco, que mergulha na agua. Assim he, que por huma especie de sucção, que a agua do vaso tende a subir nos tubos do tronco.
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Tal he em resumo a nova theoria que Dutrochet propoz, para explicar a ascensão da seiva da raiz até á extremidade superior do vegetal.
ARTIGO 6.º
Seiva descendente e sua natureza.
A existencia da seiva descendente tem sido negada por muito tempo; mas os phenomenos sensiveis da vegetação e as experiencias as mais exactas, tem demonstrado que existe huma segunda seiva, que segue huma marcha inversa da que temos precedentemente examinado.
Se fizermos em hum tronco de huma arvore dicotyledone huma forte ligadura, veremos immediatamente a formação de huma proeminencia cada vez mais sensivel; ora esta proeminencia não pode ser formada pela seiva que das raizes sobe para as folhas, por isso que se apresenta por cima e não por baixo da ligadura, deve pois depender do obstaculo que experimentão os succos que vem da parte superior para a inferior, atravez das camadas corticaes: alêm disso a parte do tronco situada por baixo da ligadura deixa de crescer, e nenhuma nova camada circular se ajunta áquellas que já existião.
He sem duvida a seiva descendente que renova e entretem continuamente o cambium, e que concorre essencialmente á desenvolução e crescimento das arvores dicotyledones.
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Segundo hum grande numero de physiologistas, esta segunda seiva não he da mesma natureza em todos os vegetaes, porque em huns fórma hum succo branco e leitoso, como nas euphorbiaceas, apocyneas; nas papaveraceas he hum succo amarellado; nas coniferas he mais ou menos rezinoso.
Outros physiologistas, entre elles Richard, pensão que a diversidade de natureza que apresentão estes succos, e a sua presença em alguns vegetaes, são outras tantas provas que apoião esta ultima opinião, parecendo que os succos proprios não são outra cousa mais do que fluidos excrementicios analogos á bile e saliva, que concorrem só indirectamente á nutrição, opinião que tem sido posta fóra de toda a duvida pelos trabalhos de Treviranus.
Em conclusão, os succos não constituem a seiva descendente, como pensão muitos authores; porque na maior parte dos vegetaes, que todos tem huma seiva descendente, não ha succos proprios: porêm estes fluidos são hum producto de huma excreção da seiva descendente.
SECÇÃO III.
Da Respiração dos vegetaes.
Dissemos e provámos precedentemente, que os vegetaes absorvem ou inspirão huma certa quantidade de ar, ou de outros fluidos aeriformes, directamente ou misturados com a seiva, isto he, por meio das suas raizes e folhas.
As plantas são como os animaes, dotadas de huma especie de respiração, que se compõe igualmente de dous phenomenos, de inspiração e expiração; todavia com a differença notavel, de não haver desenvolvimento de calorico.
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A respiração nos vegetaes he hum dos actos principaes da nutrição. Com effeito a seiva absorvida pelas raizes, e que tem circulado no tronco e suas ramificações, chega ás folhas e nellas se distribue.
As folhas pela sua organização essencialmente vascular e cellulosa, são verdadeiros pulmões, offerecendo hum grande numero de cavidades cheias de ar que tem absorvido. Estas cellulas, como já dissemos, existem principalmente na sua face inferior, communicão com o ar ambiente por meio dos estomatos; por baixo dos quaes estão constantemente situadas.
A seiva acha-se em contacto mediato com o ar destas cavidades, como o sangue dos animaes nos orgãos respiratorios, que lhes são proprios. A seiva em virtude deste contacto experimenta na natureza e propriedades, mudanças que a tornão mais apta á nutrição das diversas partes, nas quaes depois se distribue; absorve do ar huma dada quantidade do seu oxygenio, como provão as experiencias de Theodore de Saussure e Dutrochet.
Com effeito o ar contido nas folhas tem perdido huma porção do seu oxygenio, contendo apenas sobre cem partes de ar, dezoito de oxygenio em lugar de vinte e huma.
Nas plantas aquaticas, em que as folhas são destituidas de epiderme, a respiração, como provou Brogniart, faz-se á similhança da dos peixes e outros animaes aquaticos providos de guelras.
A agua sobrecarregada de ar banha immediatamente a nú as cellulas, em que a seiva existe, e este contacto he sufficiente para lhe produzir as modificações de que carece.
As folhas são sem duvida os orgãos principaes da respiração das plantas; porêm esta funcção extende-se igualmente a todas as outras partes verdes dos vegetaes.
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Com effeito, o ar comprehendido nas cavidades aereas das folhas, chegando a ellas pelos estomatos penetra nos outros orgãos, provavelmente por meio das tracheas e outros vasos porosos e fendidos; que deve necessariamente misturar-se com aquelle que tem sido absorvido pelas raizes, ou pelas outras partes verdes do vegetal munidas de estomatos.
Este ar espalhado assim em todo o interior da planta, deve exercer huma notavel influencia sobre a elaboração da seiva. Dutrochet achou que o ar contido nos troncos da nymphaea, compunha-se de dezeseis partes de oxygenio, e oitenta e quatro de azoto; entretanto que o da raiz continha mais oito partes de oxygenio sobre cem de ar.
Igualmente provou pelas experiencias, que o ar comprehendido nos orgãos aeriferos dos vegetaes, não só era necessario á sua nutrição, mas até indispensavel para o complemento dos outros phenomenos vitaes.
Assim havendo elle extrahido, por meio de huma machina pneumatica, todo o ar de huma sensitiva, esta não apresentou movimentos, que parecessem ser devidos á influencia da luz; nem se mostrou sensivel aos agentes, que de ordinario tem huma acção tão consideravel sobre os seus movimentos.
Pelo que temos dito, he facil de concluir, que a respiração dos vegetaes offerece huma grande analogia com a dos insectos. Não he por huma abertura unica, como nos animaes que respirão pelos pulmões, e que o ar penetra nos orgãos respiratorios, he como nos insectos por hum grande numero de pequenas aberturas; porque he impossivel deixar de reconhecer, que os estomatos das plantas representão exactamente os estigmas dos insectos.
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O ar huma vez entrado no interior do tecido vegetal, penetra em todas as suas partes, como reconheceu Grew e Malpighi, que as tracheas vegetaes erão perfeitamente analogas ás tracheas dos insectos, pela sua estructura e funcções.
Independentemente da absorpção do ar, e da sua acção sobre o fluido nutritivo, que constitue essencialmente a respiração das plantas, pode ainda referir-se a esta funcção a absorpção do acido carbonico, e a sua decomposição no interior do tecido vegetal.
Esta decomposição torna-se bem evidente, se mergulharmos hum ramusculo de huma arvore, ou huma planta nova, em huma campanula cheia de agua, e exposta aos raios da luz; veremos immediatamente elevar-se da sua superficie hum grande numero de bolhas formadas por hum ar muito puro, quasi inteiramente composto de gaz oxygenio.
Se ao contrario fizermos esta experiencia em hum lugar escuro, as folhas expirarão acido carbonico e azoto, em lugar de oxygenio. He necessario advertir que todas as outras partes do vegetal, que não tiverem a cor verde, taes como as raizes, cascas, flores, e fructos, sujeitas ás mesmas experiencias, emittirão sempre acido carbonico e nunca oxygenio.
Em conclusão, a expiração do gaz oxygenio depende não só da influencia directa dos raios luminosos, mas até da natureza dos corpos.
Estes resultados são devidos ás experiencias de Priestley, Ingenhouss, De Saussure, Senebier, e muitos outros celebres experimentadores.
Quando huma planta morre ou fica languida, a expiração cessa inteiramente, ou o fluido expirado he constantemente gaz azoto. Ha comtudo certos vegetaes, que expostos mesmo á acção dos raios do sol, expirão sempre gaz azoto; taes são a sensitiva, o loureiro cereja, azevinho, e muitos outros, sem comtudo se poder dar a razão de similhante phenomeno.
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SECÇÃO IV.
Da Transpiração e Excreções dos vegetaes.
A transpiração ou emanação aquosa dos vegetaes he huma funcção, por meio da qual a seiva, chegando aos orgãos folheaceos, perde e abandona a quantidade superabundante de agua que continha.
Em geral, debaixo da fórma de vapor, esta agua se exhala na atmosphera: quando a transpiração he pouco consideravel, este vapor he absorvido pelo ar á medida que se fórma, e he por consequencia invisivel. Quando porêm a quantidade augmenta, e a temperatura da atmosphera está hum pouco elevada, vemos então este liquido transpirar debaixo da fórma de gottas extremamente pequenas, que reunindo-se fórmão hum volume consideravel.
Achamos frequentes vezes, ao nascer do sol, hum grande numero de gottas, que pendem da ponta das folhas de hum grande numero de gramineas. As folhas da couve apresentão phenomenos identicos.
Julgou-se por muito tempo que erão produzidas estas gottas pelo orvalho; porêm Musschenbroeck provou por experiencias decisivas, que provinhão da transpiração vegetal condensada pela frescura da noite.
Com effeito, se interceptarmos toda a communicação de hum tronco de dormideira com o ar ambiente cobrindo-a com huma campanula; e da superficie da terra cobrindo o vaso em que está a planta com huma chapa de chumbo; e se a observarmos no dia seguinte, veremos as gottas da mesma maneira como dantes.
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Hales fez igualmente grande numero de experiencias, para avaliar a relação existente entre a quantidade dos fluidos absorvidos pelas raizes, e a que ellas exhalão. Collocou em hum vaso vidrado hum pé de helianthus annuus, cobrio depois este vaso com huma lamina de chumbo com duas aberturas, dando huma para passagem do tronco, e a outra para pode-lo regar; pesou este apparelho quinze dias successivos, e vio que pelo termo medio a quantidade de agua expirada durante as doze horas, era de vinte onças pouco mais ou menos.
Hum tempo secco e quente favorece singularmente esta transpiração, que se eleva a trinta onças em huma circunstancia similhante. Pelo contrario huma atmosphera humida diminue sensivelmente esta quantidade de transpiração.
Estas experiencias forão depois repetidas por Desfontaines e Mirbel, que tiverão occasião de admirar a exactidão e sagacidade do physico Inglez.
Senebier provou por hum grande numero de experiencias, que a quantidade da agua expirada, está para a absorvida, na relação de dous para tres; o que prova claramente que huma quantidade deste liquido he fixada, ou decomposta no interior do vegetal.
Estes factos provão de huma maneira incontestavel: 1.º que os vegetaes transpirão pelas suas folhas, isto he, que emittem huma certa quantidade de fluidos aquosos: 2.º que esta transpiração he tanto maior, quanto a atmosphera he mais quente e secca, entretanto que quando o tempo he humido, maiormente durante a noite, a transpiração he quasi nulla; 3.º que esta funcção se faz com tanta mais actividade, quanto a planta he mais nova e mais vigorosa: 4.º que a nutrição se faz tanto melhor, quando a respiração está em relação com a absorpção.
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Quando huma destas funcções se faz com huma força superior á outra, o vegetal enfraquece. He o que se observa nas plantas que estão expostas aos raios do sol, que se definhão e perdem o seu vigor; porque a transpiração não está em equilibrio então com a sucção exercida pelas raizes.
As dejecções vegetaes são fluidos mais ou menos espessos, susceptiveis algumas vezes de se condensarem e solidificarem, que certos vegetaes regeitão por differentes partes e em circunstancias particulares.
A sua natureza he muito variada: humas vezes são resinas, oleos volateis, cera: outras vezes materias saccharias, manná, oleos fixos. O fraxinus ornus por ex., na Calabria emitte hum liquido espesso e saccharino, que se concreta, e constitue o manná.
As folhas de muitas especies de acer, particularmente o acer saccharinum, se cobrem no verão de huma exsudação de materia saccharina, que se extrahe para os usos domesticos na America do Norte.
Os pinheiros, e em geral todas as arvores da familia das coniferas, fornecem quantidades consideraveis de materias resinosas.
Muitos vegetaes, taes como o ceroxylon andicola, e a myrica cerifera da America septentrional, dão huma grande quantidade de cera, que he empregada utilmente no lugar da habitação destes vegetaes.
As raizes excretão, pelas suas extremidades mais delicadas, certos fluidos que prejudicão ou são uteis ás plantas visinhas. He desta maneira que se podem explicar as conveniencias e as antipathias de certos vegetaes.
Taes são os differentes phenomenos que dependem da seiva, quando chega á parte superior do vegetal.
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SECÇÃO V.
Da Assimilação ou Nutrição propriamente dita.
Nós fizemos conhecer, tratando da absorpção da seiva, a origem dos principios elementares de que se compõem os vegetaes, isto he, o carbonio, oxygenio, hydrogenio e azoto. Estes elementos resultão evidentemente das decomposições do acido carbonico, da agua e do ar; que se fazem no interior do tecido vegetal, ou pela influencia da luz, ou mais provavelmente pelas causas diversas e desconhecidas, que são o resultado da organização e da vida.
Huma vez provada a existencia destes quatro principios fundamentaes nos vegetaes, pode-se igualmente conceber a formação dos principios immediatos, que entrão igualmente na composição das plantas, e que todos são com effeito compostos binarios, ternarios, ou quaternarios, em diversas proporções de carbonio, oxygenio, hydrogenio, azoto.
Os principios immediatos são extremamente variados e numerosos, porêm aquelles, que se encontrão mais frequentes vezes, são gomma, fecula, lenhoso, assucar, resina, oleos fixos e volateis, etc. Vide cap. 15.º
Estes principios varião não só nas diversas especies de vegetaes, mas ainda nos orgãos ou partes em que se observão; assim por ex. os oleos gordos achão-se somente nas sementes e em alguns pericarpos, e a fecula existe mais especialmente no tronco e na raiz.
Estes principios immediatos sendo todos compostos de carbonio, oxygenio, hydrogenio, azoto, e estes elementos formando-se, ou chegando continuamente aos tecidos vegetaes, vê-se claramente, que elles devem servir á formação destes principios. Mas como servem elles, e em virtude de que força tem lugar estas combinações; porque em hum caso se fórma fecula, em outro se fórma assucar, gomma, etc.? São questões insoluveis pela observação directa.
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Sabemos somente, que os seus elementos existem no tecido cellular; porêm no estado actual da sciencia ignora-se perfeitamente a causa directa que os produz. Deve necessariamente ter lugar alguma combinação chimica, pois que achamos nestes principios os mesmos elementos, somente em diversas proporções.
Devemos ainda admittir, que estas mudanças de composição que se operão durante a nutrição; e que estes principios novos são o resultado da existencia da vida e da organização, e não simplesmente effeitos da affinidade chimica.
Os terrenos influem consideravelmente em hum grande numero de circunstancias, sobre a composição chimica dos vegetaes. Assim as plantas que vivem nas visinhanças do mar, contêm huma grande proporção de sal marinho: aquellas que vegetão nos muros velhos dão huma grande quantidade de nitracto de potassa.
Notamos comtudo que isto he simplesmente em virtude de huma acção physica.
Os phenomenos sensiveis da nutrição, são 1.º o augmento das diversas partes da planta: 2.º o desenvolvimento successivo dos seus orgãos, tanto da vegetação como da reproducção.
Acabámos de vêr os differentes phenomenos, que tem relação ou concorrem á nutrição dos vegetaes. Vimos que os succos são absorvidos pelas raizes no seio da terra, dirigindo-se por huma força particular dependente da vida do vegetal, até ás partes mais elevadas das ultimas ramificações do tronco; onde depois soffrem huma mistura com os fluidos absorvidos, despojando-se dos principios aquosos aeriformes inuteis á nutrição, adquirindo propriedades novas, e seguindo huma marcha retrogada.