Dicionário de Cultura Básica/Bocage

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BOCAGE (poeta português) → Arcadismo

"Aqui dorme Bocage, o putanheiro;
Passou vida folgada e milagrosa;
Comeu, bebeu, fodeu sem ter dinheiro"
(auto-epitáfio do poeta)

Manuel Maria Barbosa du Bocage (1765–1805) é o maior poeta lírico lusitano do século XVIII. Conforme a moda do Arcadismo, adotou o nome bucólico e anagramático "Elmano Sadino", mas logo soube desvincular-se das amarras da escola arcádica para produzir uma lírica pessoal, intimamente sentida. Do itinerário poético de Bocage a crítica distingue três fases: a produção juvenil, que segue os modelos da estética do Arcadismo (poesia amorosa, bucólica, elegíaca); a poesia satírica, irreverente, revolucionária, pela qual entrou em conflito com os escritores da época; a fase madura do lirismo pessoal, em que canta a solidão existencial. A produção poética desta última fase é, sem dúvida, a mais importante, pois o tom pessimista da sua lírica noturna prenuncia o Romantismo. Mas ele è mais conhecido como poeta gozador e obsceno. Veja-se o seguinte soneto:

Não lamentes, oh Nise, o teu estado;
Puta tem sido muita gente boa;
putíssimas fidalgas tem Lisboa,
milhões de vezes putas têm reinado:

Dido foi puta, e puta dum soldado;
Cleópatra por puta alcança a c’roa;
Tu, Lucrécia, com toda a tua proa,
O teu cono não passa por honrado;

Essa da Rússia imperatriz famosa,
Que inda há pouco morreu (diz a Gazeta)
Entre mil porras expirou vaidosa:

Todas no mundo dão a sua greta;
Não fique pois, oh Nise, duvidosa
Que isto de virgo e honra é tudo peta.