Dicionário de Cultura Básica/Parnaso
PARNASO (Parnasianismo: moda poética da época do Realismo)
Nunca entrarei jamais no teu recinto
(do soneto "Perfeição" de Olavo Bilac)
O movimento literário do Parnasianismo, exclusivamente ligado à poesia, surgiu na França na época do Realismo e em oposição à lírica romântica, (→ Romantismo) estando o termo relacionado com uma figura mitológica, que deu nome a uma montanha da Grécia: o monte Parnaso, morada das Musas e de Apolo, onde poetas e músicos buscavam inspiração. O nome "parnasianismo" derivou de uma antologia poética, Le parnaise contemporain, que foi publicada durante a década de 1866–1876. Com interesse apenas no texto versificado e guiado pela estética da "arte pela arte", proposta pelo chefe da escola, o poeta Gauthier, o parnasianismo volta ao ideal clássico da beleza como harmonia de formas, retratando incidentes históricos, assuntos mitológicos e fenômenos naturais, em versos perfeitos quanto a sua estrutura métrica e sonora, predominando a técnica sobre a inspiração. É interessante notar que a lírica parnasiana só vingou na França e no Brasil, não tendo sido cultivada de uma forma relevante em outros países. Os nossos poetas do fim do século XIX e do início do XX, durante duas gerações aproximadamente, deleitaram-se com a nova moda importada da França, opondo-se esteticamente à poesia ultra-romântica. Lembramos a famosa tríade: Alberto de Oliveira (1859–1937), Raimundo Correia (1859— 1911) e Olavo Bilac (1865–1918). A breve análise de um soneto deste último poeta, cujo título é Perfeição, ilustrará alguns aspectos deste tipo de poética:
Nunca entrarei jamais no teu recinto:
Na sedução e no fulgor que exalas,
Ficas vedada, num radiante cinto.
De riqueza, de gozos e de galas.
Amo-te, cobiçando-te... E, faminto,
Adivinho o esplendor das tuas salas,
E todo o aroma dos teus parques sinto,
E ouço a música e o sonho em que te embalas.
Eternamente ao meu olhar pompeias,
E olho-te em vão, maravilhosa e bela,
Adarvada de altíssimas ameias.
E à noite, à luz dos astros, a horas mortas,
Rondo-te, e arquejo, e choro, ó cidadela!
Como um bárbaro uivando às tuas portas!
O título, que já traz a indicação do tema do poema, evidencia a principal preocupação da estética parnasiana: a busca da perfeição artística. Todo o corpo do soneto, composto de duas quadras e dois tercetos, pode ser considerado como uma grande anáfora em relação ao título: tudo o que é dito no poema está relacionado com a "perfeição". Além de ser o tema de que o poeta trata, a figura da perfeição funciona também como destinatária intratextual: o "eu" poemático a ela se dirige, como se fosse um ser humano, usando o pronome "tu", e a ela invoca através da imagem da "cidadela", que aparece no penúltimo verso. A idéia abstrata da perfeição encontra-se configurada, no poema, por imagens plásticas que a tornam um objeto concreto: ela é descrita como se fosse um castelo, uma fortaleza circundada de muros altos, impossível de ser expugnada pelo homem. Nessa cidadela, reside tudo o que é objeto de desejo do ser mortal: a riqueza, o prazer, as honrarias, o aroma, a música, todas as maravilhas sonhadas. A aderência de Olavo Bilac à estética parnasiana se percebe não só pelo tema — a busca inglória para alcançar-se a perfeição na arte —, mas também por elementos estruturais. A própria forma poemática — o soneto —, de largo uso na poética clássica, obriga o poeta a disciplinar os arroubos do sentimento, aprisionando a inspiração no reduzido espaço de dois quartetos e dois tercetos, com rimas alternadas e entrelaçadas. Também a escolha lexical releva o gosto parnasiano por palavras eruditas, preciosas que, embora dicionarizadas, não pertencem sequer ao uso da norma culta: "pompeias", "adarvada", "ameias". Enfim, esse soneto de Olavo Bilac é uma boa amostra da preocupação estética parnasiana: a volta aos modelos formais do Classicismo, imitando Petrarca, Camões, Tasso, produzindo uma poesia erudita, perfeita na sua construção fônica e sintática, e retomando os temas universais que idealizam a existência humana. Por incrível que pareça, a lírica parnasiana está aos antípodas dos princípios estéticos do momento histórico em que foi produzida: o período do Realismo. E isso porque, ao surgir em oposição ao cânone estético do Romantismo, a poesia parnasiana retomou simplesmente a concepção de arte do Classicismo, sem adaptá-la à nova realidade.