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História do Brasil (Frei Vicente do Salvador)/IV/XXXI

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Despedido o governador desta Bahia, em poucos dias chegou à capitania do Espírito Santo, onde por lhe dizerem que havia metais na serra de mestre Álvaro, e em outras partes, as tentou e mandou cavar, e fazer ensaio, de que se tirou alguma prata. Também mandou que fossem as esmeraldas, a que já da Bahia havia mandado por Diogo Martins Cão, e as tinha descobertas; fez um forte pequeno de pedra e cal, em que pôs duas peças de artilharia para defender a entrada da vila, e feito isto se partiu para o Rio de Janeiro, donde foi recebido do capitão-mor, que então era Francisco de Mendonça, e do povo todo com muito aplauso, por ser parte onde nunca vão os governadores gerais; e assim achou tantos pleitos cíveis, e crimes indícios, que para os haver de julgar lhe fora necessário deter-se ali muito tempo: pelo que mandou chamar o ouvidor-geral Gaspar de Figueiredo Homem, que se havia casado em Pernambuco, para o deixar ali.

Chegado o ouvidor, e estando o governador para se partir, lhe tomaram a barra quatro galeões de corsários, o qual entendendo que haviam de sair à terra a tomar água na ribeira de Carioca, lhe mandou pôr gente em ciladas junto dela; e assim aconteceu que indo quatro lanchas, e saindo primeiro a gente só de uma, e tendo já a água tomada para se tornarem a embarcar, lhes saíram os nossos, e os mataram todos, exceto dois, que levaram malferidos ao governador, e os das outras lanchas vendo isto se tornaram às galés, nas quais sabendo de um mamaluco, que haviam tomado em uma canoa, que estava ali o governador d. Francisco de Souza, e determinava mandar-lhes queimar os navios, os fizeram logo a vela, e lhe deixaram a barra livre para seguir a sua viagem, como seguiu, e chegou a São Vicente, onde daí a pouco tempo entrou outro galeão em que ia por capitão um holandês chamado Lourenço Bicar, o qual fez petição ao governador, dizendo que ele era bom cristão, e nunca fizera dano aos cristãos, nem ia a aquele porto com esse intento, senão a vender suas mercadorias, pelo que pedia a Sua Senhoria licença para as poder descarregar, e vender com pagar os direitos a Sua Majestade, e o governador lha despachou, que sendo assim como dizia, e não havendo outra coisa, lhe dava licença, porém tirando depois inquirição, e achando que tinha ido por general de uma grossa armada ao estreito de Magalhães, e por não o poder embocar com tormenta, e se apartar dos mais companheiros, os vinha ali aguardar, mandou em uma canoa seis aventureiros armados, que com dissimulação de quererem ver a nau se senhoreassem da pólvora, e praça de armas, e logo atrás desta outras moitas com soldados e índios flecheiros, que brevemente a abordaram, e tomaram, sem que os de dentro pudessem defendê-la nem pôr-lhe o fogo, como quiseram, por lhe terem os nossos tomado a pólvora e armas.

Importaria a fazenda que esta nau trazia mais de 100 mil cruzados, os quais com a mesma facilidade se gastaram, que se adquiriram, e o governador se foi de São Vicente à vila de São Paulo, que é mais chegada às minas, onde até então os homens e mulheres se vestiam de pano de algodão tinto, e se havia alguma capa de baeta e manto de sarja se emprestava aos noivos e noivas para irem à porta da igreja; porém depois que chegou d. Francisco de Souza, e viram suas galas, e de seus criados e criadas, houve logo tantas librés, tantos periquitos, e mantos de soprilhos, que já parecia outra coisa; com isto se havia pagado d. Francisco da Bahia muito, muito mais se pagou de São Paulo; porque são ali os campos como os de Portugal, férteis de trigo, e uvas, rosas, e açucenas, regados de frescas ribeiras, onde ele umas vezes caçando outras pescando entretinha o tempo, que lhe restava do trabalho das minas, que era mui grande, e muito maior não ser sempre de proveito, porque como é ouro de lavagem, umas vezes se levava pouco, ou nenhuma, mas outras se achavam grãos de peso, e de preço, e de que ele enfiou um rosário, assim como saíam redondos, quadrados ou compridos, que mandou a Sua Majestade com outras mostras de pérolas, que se achavam no esparcel da Canané, e em outras partes, mandando-lhe pedir provisão para fazer descer gentio do sertão, que trabalhassem neste ministério, e outras coisas a ele necessárias, a que lhe não deferiram por morrer neste tempo el-rei Filipe Primeiro, que o havia enviado, e lhe sucedeu seu filho Filipe Segundo, que o mandou ir para o reino, havendo 13 anos que governava este estado, e lhe enviou por sucessor no governo Diogo Botelho.