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História do Brasil (Frei Vicente do Salvador)/V/XXVIII

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Aos 19 de dezembro da dita era de 1624 tomou a nossa armada de Portugal as ilhas de Cabo Verde, donde levava ordem de Sua Majestade, que não passasse sem a armada da coroa de Castela; aos quatorze havia derrotado da mais armada o galeão Conceição, de que era capitão Antônio Moniz Barreto, mestre de campo; e aos vinte deu à costa com tormenta nos baixos de Santa Anna na ilha de Maio, das onze para a meia-noite, morreram cento e 50 soldados, que se lançaram ao mar, vendo que não iam com os fidalgos na primeira batelada, e ainda se houveram de lançar a perder mais, se não acudira d. Antônio de Menezes, capitão de infantaria, filho único de d. Carlos de Noronha, mancebo de 22 anos, exortando-os que tivessem paciência até tornar o batel, e esperança em Deus, que todos se haviam de salvar, nem ele os havia de desacompanhar até os ver todos salvos, postos em terra; o mesmo lhes disse d. Francisco Deça, filho de d. Jorge Deça, e com o exemplo destes dois fidalgos se deliberaram todos a passar ou no batel, ou em outros modos, que cada um inventava, de jangadas, e pranchas de paus e tábuas, entre os quais se salvaram também dois frades da nossa província de Santo Antônio, frei Antônio, e frei Francisco, que vinham por capelães do galeão, um no batel, outro em uma cruz, que engenhou de duas tábuas, figura daquela em que esteve, e está toda a nossa salvação, e remédio; chegando recado ao general d. Manuel de Menezes da desgraça do naufrágio, avisou logo ao governador de Cabo Verde Francisco de Vasconcellos, e a João Coelho da Cunha, senhor da ilha de Maio, onde o naufrágio sucedera, para que mandassem socorrer aos perdidos, o que eles fizeram com tanto cuidado que não só os curaram, e regalaram, mas com sua ajuda, de seus escravos, e criados se tirou a artilharia, munições, enxárcias do galeão, e outras causas tocantes assim à fazenda de Sua Majestade como de particulares, que se deram a seus donos, e com isto se entreteve ali a armada 50 dias, até chegar a de Castela, que esperavam, a qual era de 32 naus; na capitania real vinha por generalíssimo do mar e terra d. Fadrique de Toledo, por almirante d. João Fajardo, general do estreito, na sua.

Na capitania de Nápoles, capitão o marquês de Cropani, mestre de campo general da empresa. Na almeiranta o marquês de Torrecusa, mestre de campo do Terço de Nápoles. Na capitania de Biscaia, general Valezilha. Na almeiranta seu irmão. Na capitania de Quatro Vilas general d. Francisco de Azevedo. No galeão Santa Anna, que era também desta esquadra de Quatro Vilas, capitão d. Francisco de Andruca (?); e neste vinha o mestre de campo do Terço da Armada Real de Orelhana, em outro d. Pedro Osório, mestre de campo do Terço do Estreito, e em outros de todas as esquadras outros capitães, sargentos, e oficiais de guerra, a que não sei os nomes, mas nos tratados particulares, que se imprimiram da jornada, se poderão ver, e neste nos capítulos seguintes se verão as obras, das quais, mais que dos nomes, se colige a verdadeira nobreza.

Juntas pois estas armadas no Cabo Verde, e feitas suas salvas militares, e cortesãos cumprimentos, se partiram daí em 11 de fevereiro de 1625 em dia de entrudo para esta Bahia, à qual chegaram em 29 de março, véspera de Páscoa, a salvamento, somente se perdeu a nau Caridade, de que era capitão Lançarote de Franca, em os recifes da Paraíba, mas acudiu-lhe logo seu tio Afonso de Franca, que era capitão-mor da Paraíba, com barcos e marinheiros, e quatro caravelões, que mandou o governador de Pernambuco, com que salvaram não só a gente toda, exceto dois homens, que aceleradamente se haviam lançado ao mar, mas depois o casco da nau com todo o massame, armas, artilharia, munições, e o capitão Lançarote de Franca, deixando a nau, para que a mastreassem, porque lhe haviam cortado os mastros, se foi com os seus soldados a Pernambuco, e daí em sete caravelões, que o governador lhes deu, a Bahia, onde chegou no mesmo dia que a armada.