Horto (1910)/Meu sonho
A Yayá e a Maria Leonor Medeiros.
Eu tenho um sonho que no Céo mora
Feito de luz e feito de amor,
Um sonho roseo como uma aurora,
Um sonho lindo como uma flor.
E eu vivo sempre, sempre sonhando,
O mesmo sonho de noite e dia,
O mesmo sonho suave e brando
De minha vida toda a alegria.
Quando soluço, quando minh’alma,
Cheia de angustia, fica a chorar,
O sonho amado me traz a calma
E então minh’alma põe-se a rezar.
Quando, nas noites frias de inverno,
Eu tenho medo da tempestade,
Elle, o meu sonho, consolo eterno,
Transforma as sombras em claridade.
Quando no seio, choroso e louco,
Palpita, incerto, meu coração...
O sonho doce vem, pouco a pouco,
Trazer-me a graça de uma illusão.
E eu canto e rio na luz dispersa
Deste diluvio de phantasias...
Minh’alma vôa no Azul immersa
Buscando a patria das harmonias.
Imagem doce, visão sagrada,
Chimera excelsa dos meus amores,
Perola branca, delicia amada
Balsamo puro das minhas dôres;
Elle, o meu sonho, pharol que encanta,
Guia-me á patria da salvação
Sorriso ingênuo, reliquia santa,
Do relicario do coração!