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Página:Violeiros do norte (1925).djvu/164

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L E O N A R D O M O T T A

S. Gonçalo do Amarante,
Meu santo casamenteiro,
Antes de casar as outras,
Me casae a mim, primeiro!

é a affirmação de ingenua crença, não consciente remoque ao falado poder excepcional de um titular da Côrte Celeste. Mesmo aquelles versos que dizem:

Meu São Francisco das Chagas,
Meu santo do Canindé,
Eu sei que Santo não voga
Naquillo que Deus não quer...

não importam, propriamente, uma ironia, sim a revelação do exacto valor das mediações perante o Juiz Supremo.

A proposito desta ultima quadra devo lembrar, aliás, que ella excéde um pouco o legitimo adagio portuguez: “Quando Deus não quer, Santo não rogam”. A quadrinha nordestina admitte a inutil intercessão dos Santos, pois affirma que não vogam, isto é, não têm valor, ás vezes, os rogos dos intermediários da Divindade.

Olavo Bilac, numa conferencia sobre “O feiticismo dos poetas brasileiros”[1], narrou a anecdota de uma sua amiga, illustre senhora patricia que em Portugal se lhe queixava da falta de seu Santo Antonio que ficára no Rio de Janeiro. Como o poeta observasse que a devota dama tinha sobre a commoda uma imagem do meigo e misericordioso santo lisboeta, ouviu como resposta que aquillo não era a mesma cousa: ella só se dava bem com o seu Santo Antonio, o do Rio de Janeiro, que já a conhecia, tinha intimidade comsigo e nada lhe recusava...

Esse “feiticismo” observado por Bilac num espirito relativamente illustrado eu o verifiquei na Parahyba, apanhando a quadra:

Não quero Santo Antonio grande
Dentro dos meus oratóro:


  1. Publicada em Ultimas conferencias e discursos (1924) (projeto de transcrição), p. 268-298. [Nota editorial da Wikisource]